Arquivo anual: 2017

Os Black Blocs e a Democracia – #tbt

Originalmente publicado na Feedback Magazine, em 25 de Novembro de 2013. As opniões do texto não refletem, necessariamente, a minha opnião atual, já que eu sou um ser em constante evolução e que prefere “ser esta metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opnião formada sobre tudo”.


Muito tem se discutido, desde as manifestações de Junho, sobre a legitimidade de atos de protestos que utilizam de violência, seja contra pessoas (a hostilização de repórteres e membros de partidos em Junho também foi uma forma de violência, do mesmo nível da causada pela PM aos manifestantes e repórteres), seja contra patrimônio público ou privado. Os atos de “vandalismo” ganharam o nome e o “rosto” (encoberto) dos Black Blocs.

Historicamente, percebemos que “revolução” pacífica não gera efeito, aliás, nem é revolução. Porém, num estado democrático de fato e de direito, como o nosso, “revoluções” nem deveriam existir. Para começar, vamos abrir um (grande) parêntese para explicar o que é democracia (sim, infelizmente muita gente não sabe) e acabar com esta ideia de que “no Brasil não existe democracia”.

Bem, ao contrário do que muita gente pensa, democracia não é o “faça o que tu queres pois é tudo da lei”. Democracia não é a concordância plena, mas sim a maneira mais inteligente de gerenciar a discordância.

Na democracia, não é porque você acha que algo é certo, que você terá o direito de fazê-lo. Você pode até fazer, desde que não “incomode” mais ninguém (são as famosas “liberdades individuais”, um dos pilares da democracia). Um exemplo: você pode ser um naturista e gostar de andar nu, porém, como isto agride e ofende a maioria das pessoas, você não pode andar nu por aí.

O britânico Stephen Gough, de 53 anos, é conhecido como “o andarilho nu”. Ele acredita que a nudez é um direito fundamental e insiste em andar pelo país sem roupas. Como a maioria do povo britânico discorda desse “direito”, Stephen já passou mais de seis anos preso por “perturbar a paz”. | Créditos: BBC Brasil.

Dentro de uma democracia, o poder provém do povo (do grego demos = povo), seja diretamente (através de plebiscitos, referendos, audiências públicas, etc.), seja indiretamente, através de representantes eleitos pelo povo (vereadores, prefeitos, deputados, senadores, governadores e presidente).

A existência de liberdade de imprensa e expressão também é outro pilar básico da democracia. Aqui existe também muita confusão. Liberdade de expressão quer dizer que você pode dizer o que quiser sobre qualquer pessoa. Mas também quer dizer que você deve ser responsável por aquilo que fala, tanto que, não existe opinião “anônima”, já que, quem se sentir ofendido por algo que alguém falou, tem todo o direito de procurar a justiça e a pessoa que emitiu a opinião pode, se a justiça entender que deve, ser punida. Da mesma forma, não é porque existe liberdade de expressão, que ela possa ser exercida em qualquer lugar. Outro exemplo prático: o dono desta revista eletrônica pode deletar alguns comentários que ele julga inadequado. Ele não está sendo “antidemocrático” ou cerceando o seu direito de livre expressão. No caso, a revista é dele, é um espaço privado. Se você discordar da atitude dele em deletar seu comentário, você tem todo o direito de criar você mesmo um blog ou uma página, e postar a sua opinião.

Além destes pilares, alguns outros são: um judiciário autônomo, a igualdade entre as pessoas (todos são iguais perante a lei), liberdade para constituição de organizações sindicais e políticas (partidos), etc.

Bem, trazendo isto para a realidade do Brasil, podemos garantir que no Brasil existe sim democracia. Aqui existe liberdade de imprensa e expressão, existe garantia às liberdades individuais, o povo escolhe seus representantes de forma igualitária, existe liberdade para a constituição de organizações políticas e temos um judiciário independente (a condenação dos réus do Mensalão mostra isto). É claro que alguns ajustes necessitam ser feitos, até porque, nossa constituição é uma das mais recentes (1988) e somos uma das democracias mais novas do mundo (menos de 30 anos). Mas não dá para dizer que no Brasil existe uma “falsa democracia” ou que ela não exista.

Aí existe outro porém: se o povo prefere abdicar de fazer suas escolhas de uma forma racional, votando por critérios subjetivos como simpatia ou antipatia, ou por interesses pessoais (cestas básicas, cargos, etc.), o problema é do povo, e não do sistema. Como diria a música Freewill (livre arbítrio), do grupo canadense Rush: se você escolher não se decidir, ainda assim terá sido uma escolha.

Os bancos são os maiores alvos dos Black Blocs.

Num Estado onde existe democracia e o povo faz suas escolhas, não existe espaço para “revoluções”, já que a situação deste Estado é feita pela escolha da maioria das pessoas que o compõe. Se o intuito dos Black blocs nestas manifestações onde existe violência é chamar a atenção do público para fatos errados no sistema, e fazer, desta forma, o povo analisar e escolher melhor, ou se então a intenção é reivindicar garantias de direitos individuais, mesmo os atos mais violentos têm legitimidade (e desde que eles assumam os riscos e consequências destes atos).

Porém, se a intenção deles é impor algum desejo, ideologia ou valores, que são apenas de uma minoria, para toda a população, aí até o protesto em si, mesmo sem violência, perde sua legitimidade.

Aliás, a diferença entre o revolucionário e o golpista é apenas de perspectiva: se vai de encontro aos seus ideais, você enxerga como revolução, se vai contra, como golpe. Mas em ambos os casos, sempre existe, no fundo de um revolucionário/golpista, a sementinha do mal do totalitarismo, esperando o momento propício de germinar.

Agora resta aos Black Blocs virem à público explicar qual o sentido, o objetivo das manifestações.

Isto se eles mesmos souberem.

Be happy! 🙂

Maverick – Ricardo Semler (08/2017)

Considero o livro “Virando a Própria Mesa”, do Ricardo Semler, um dos dez livros que mudaram a minha vida. Neste livro ele descreve como passou de um playboy que poderia apenas ter aproveitado o status quo e sua posição confortável nele para curtir a vida com os recursos que seu pai já havia garantido para a família. Mas ao invés disto, preferiu se aventurar e se reinventar, questionando e tentando mudar a parte do mundo que lhe é possível (incluindo a sí mesmo).

“Perguntaram a três cortadores de pedra o que eles faziam. O primeiro disse que cortava porque era pago para fazer isto. O segundo respondeu que usava técnicas especiais para moldar pedras de forma incomum e prosseguiu para demonstrar sua habilidade. O terceiro apenas sorriu e disse: Eu construo catedrais”

Nao que eu seja playboy ou meus pais tenham garantido meu futuro (muito longe disto!), mas se alguém que se beneficia do status quo tem coragem para desafiá-lo, por que cargas d’água eu, que não tenho beneficio nenhum, teria que me conformar? Então junto com outras coisas, o livro me ajudou a abrir a cabeça e a não seguir aquele roteiro que nos é imposto assim que nascemos (nascer, crescer, estudar, arrumar um bom emprego, ser aquele “dito cidadão respeitável que ganha quatro mil cruzeiros por mês” e que acaba sentado “num trono de um apartamento com a boca escancarada e cheia de dentes esperando a morte chegar”). A parte do livro em que ele descreve como descobriu que seu amor pela música era bem maior que o seu talento para ela, o que o fez desistir do sonho de ser músico, também foi algo que me influenciou (e no meu caso, além da falta de talento, sempre faltou disciplina).

No segundo livro que eu li do Semler, o “Você Deve Estar Louco”, ele discorre mais sobre como ele mudou a forma e a cultura das empresas que herdou do seu pai. E de certa forma também me influenciou no sentido de entender em que tipo de empresa eu gostaria de trabalhar.

Maverick é uma compilação dos dois livros feita para o mercado americano, ou seja, tem um pouco da biografia do Semler, mas o grosso do livro é sobre as experiências e o modelo implementado por ele em suas empresas. O público alvo talvez tenha sido a razão de ele ser escrito mais como um manual de negócios do que apenas como uma história, como acontece com os dois livros lançados no Brasil.

Se alguém está buscando um manual de praticas empresariais, o Maverick é um ótimo livro, já que vai direto ao ponto. Agora se a pessoa quer apenas ler uma boa história, que pode servir ou não de motivação pessoal, sugiro ler os dois lançados em português, especialmente o “Virando…”.

Be happy 🙂

Wanderlust #39 – San Francisco – Califórnia (3/51) – Estados Unidos

(30/Mar/2017-02/Abr/2017)

Devido aos imprevistos ocorridos na trip entre LA e San Francisco, pegamos um baita de um trânsito (horário de pico) e acabamos chegando na cidade já a noite. Nos dirigimos ao hotel, que ficava no bairro Tenderloin – um dos mais centralizados e movimentados. A primeira vista, a área onde o hotel ficava não era das melhores e confesso que me incomodou um pouco a quantidade de moradores de rua no local (não pelos moradores de rua, mas por conta de algum perigo). Mesmo quando a recepcionista nos avisou que eles eram todos harmless, ainda fiquei com aquela pulga atrás da orelha, mas mesmo assim fomos dar uma volta e procurarmos algo para comer. A região central estava deserta, o que me causou um estranhamento, pois mesmo sendo uma quinta à noite, normalmente algum movimento nas áreas centrais existe. Então a primeira impressão da cidade acabou não sendo muito boa. Depois de comermos nos dirigimos ao Zeigeist, um bar com temática punk, ótimas opções de cervejas e um aprazível biergarden.

No outro dia voltamos a downtown e a minha impressão começou a mudar: o centro estava muito movimentado, tanto de turistas quanto de locais, já que era um dia útil. De lá, fomos até a região conhecida como Embarcadero, que é a região onde se encontram, além dos terminais de passageiros (lembrando que a cidade fica numa baia, ou seja, para acessar outras cidades precisa usar pontes ou barcos), alguns shoppings, restaurantes, centros de exposições, etc. Toda esta região parece ser sido revitalizada há pouco tempo e parece ter como público alvo os próprios moradores da região

Caminhando sentido norte, chega-se ao Fisherman’s Wharf, que é um complexo com restaurantes, bares, museus, também à beira mar, porém mais voltado para os turistas. Andamos um pouco por ali e seguimos até a Ghirardelli Square, depois subimos a Russian Hill para cair na Lombard Street, que tem a fama de ser a rua mais sinuosa e inclinada do mundo (ela e sinuosa justamente pelo fato de ser inclinada: para que os carros não trafeguem por um declive muito íngreme). Duvido que a fama resistiria se visitassem algumas ruas das periferias de São Paulo ou Rio.

Voltamos para a Ghirardelli Square e pegamos o famoso Cable Car de San Francisco, passeio obrigatório para quem vai à cidade, no sentido downtown. De lá fomos ate a Mission Bay pois queriamos visitar o biergarten da Anchor (que recentemente foi vendida para a japonesa Sapporo). No caminho passamos pelo belo Yerba Buena Gardens. O biergarten da Anchor fica em frente ao estádio dos Giants e, como estava tendo jogo, ficamos pouco tempo (alem de não termos podido pedir o sample flight por este motivo). Já era final de tarde então resolvemos voltar para a região de Tenderloin / Union Square, mas no meio do caminho, na região conhecida como SoMA (South of Market) encontramos a Thirsty Bear brewery e ai toca experimentar mais cervejas. 

Jantamos em um Italiano (sendo mal atendidos novamente!) e voltamos ao hotel. No outro dia, fomos conhecer talvez a atração mais famosa da cidade: a famosa Golden Gate. Para que o dia rendesse, preferimos percorrer a ponte de carro, então passamos por ela e nos dirigimos ao mirante que fica logo do outro lado. A atração é superestimada, como são superestimadas a maioria das atrações nos EUA, mas mesmo assim, a propaganda (em filmes, quadrinhos, livros, etc.) é tanta que mesmo com a consciência de que não passa de uma ponte, você ainda acha legal….hahaha

Depois de algumas fotos, seguimos para Sausalito, uma pequena cidade que fica do outro lado da baia. É uma pequena e charmosa cidade litorânea. Valeria a pena almoçar em alguns dos restaurantes a beira mar, mas ainda era muito cedo e então voltamos rápido. Na volta, já tínhamos programado para visitar um outro mirante, que proporciona uma vista do outro lado e por cima da ponte. Neste mirante precisa de paciência, pois existem poucas vagas (demos sorte de alguém estar saindo quando já estávamos quase desistindo).

De lá fomos para o Golden Gate Park, que mereceria um dia somente para ele, e também passamos em Ocean Beach, que fica na frente do parque. Nunca ouvi falar que San Francisco tivesse turismo voltado para as praias, como Los Angeles ou San Diego. Se as demais praias da cidade forem como Ocean Beach, está entendido o motivo. Não que seja feia, ou suja. Simplesmente não é nada. Não é bonita (tampouco é feia), não tem onda (para servir aos surfistas), não tem restaurantes. É apenas sem graça.

Deixamos o carro no hotel e fomos explorar um pouco mais, iniciando pela Union Square (por onde já tínhamos passado no dia anterior, muito rapidamente) e passando por Chinatown (sem graça como todas as Chinatowns que eu já conheci). Caminhamos então para o Fisherman’s Wharf, para onde queríamos voltar para comprarmos alguns souvenirs, tomarmos um clam chowder e depois fazermos hora até o pôr-do-sol no Jack’s Cannery Bar, que havíamos visto anteriormente. No caminho cruzamos com o Washington Square Park, que estava tomado de pessoas aproveitando o belo dia de sol (e tomando cervejas e vinhos!). 

Pra encerrar a trip da Califórnia era hora da já tradicional (para a costa leste dos EUA) foto do pôr-do-sol.

Assim como ocorreu com o Rio de Janeiro, sai de San Francisco com aquela sensação de “por que não conheci esta cidade antes?”, especialmente porque tive muita oportunidade e nunca me interessei em ir.

Observações, dicas e considerações:

  • San Francisco para mim acabou sendo a mais “brasileira” das cidades americanas que conheci até agora. Uma mistura de São Paulo (culinária, cultura, vida noturna) com o Rio (descontração, praia, despojo).
  • A vantagem em relação às cidades brasileiras é que eles entenderam e aplicam o conceito de “multimodalidade” no transporte: tem trólebus, bonde, metro, trem, bicicletas, tudo muito bem integrado, num nível visto geralmente em cidades europeias.  
  • Para completar, os serviços de transporte individual privado (Lyft e Uber) são tão rápidos, baratos e eficientes que não duvido que, em pouco tempo, pouca gente na cidade terá veículos particulares. É impressionante a disponibilidade do Lyft: você clica na solicitação e o sistema ja direciona um carro que esta a poucos metros de você.
  • Por falar em veículos particulares, ao contrário do restante da California, onde a Kombi é normalmente o “carro descolado”, em San  Francisco o Fusca parece ser o queridinho.
  • Não existem cabines de pedágio na Golden Gate (apesar de ter aviso do valor de pedágio): eles simplesmente fotografam a placa e mandam a conta do pedágio para o endereço de registro do veículo, como se faz com multas no Brasil. Este sistema está sendo implementado em outros estados também (Massachussets, New York e Connecticut são alguns que eu sei que usam). No caso de carro alugado, a locadora irá cobrar, posteriormente, o valor do pedágio (e provavelmente alguma taxa adicional) do cartão usado para a locação.
  • Nao deixe de provar os chocolates da Ghirardelli. Para mim não perde em nada para, por exemplo, os da Lindt. E nas lojas geralmente eles dão amostras grátis. Por isto não hesite em entrar sempre que passar por uma (a dica vale para as outras lojas em toda a Califórnia).  
  • Segundo a Lei da Califórnia, é proibido o transporte de containeres de bebidas alcoólicas que estejam abertos ou com o lacre quebrado (na verdade, a “proibição de beber em público” se resume a leis assim praticamente em todo os EUA). Porém, alguns locais públicos podem permitir, temporária ou permanentemente, a posse de containeres abertos, o que implica, automaticamente, na “revogação” da proibição de consumo. Tem uma lista dos parques em San Francisco onde e permitido aqui.
  • Outra exceção e quando o container está sendo transportado para reciclagem. Fica a dica 😉.

Be happy 🙂

Bonde antigo em Embarcadero

Fisherman’s Wharf

Alcatraz

Fisherman’s Wharf

Fisherman’s Wharf

Lombard Street

Cable Car na Ghirardelli Square

Yerba Buena Gardens

Anchor Beer Garden – Mission Bay

Golden Gate

Sausalito

Golden Gate

Golden Gate

Sobre ostentação, Maslow e a Vida Alheia – #tbt

Originalmente publicado na Feedback Magazine, em 19 de Novembro de 2013. As opniões do texto não refletem, necessariamente, a minha opnião atual, já que eu sou um ser em constante evolução e que prefere “ser esta metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opnião formada sobre tudo”.


 

A sensação dos últimos dias na internet foi o vídeo, produzido pela revista Veja SP, sobre o tal “Rei do Camarote”. À despeito de tudo ser tão surreal e caricato que para mim parece um viral (e uma bela barrigada da Veja), algumas coisas me chamaram a atenção.

Antes de tudo, eu sou da opinião que as pessoas podem fazer o que acharem melhor para sua vida, desde que não prejudiquem outras pessoas. Neste caso, o dinheiro é do cara, desde que ele tenha ganho honestamente, ele faz com o dinheiro dele o que ele quiser. Ninguém tem nada a ver com isto. Se ele quer encher o camarote dele de Marias “Veuve Cliquot” e ser encoxado por um humorista (dos ruins!), o problema é só dele e das pessoas que o acompanham.

Mas a primeira coisa que me chamou a atenção foram os dois pesos e duas medidas de algumas pessoas ao fazerem julgamentos. Já começaram errado por fazerem julgamento, mas já que o fizeram, que ao menos usassem de imparcialidade e tivessem coerência. O que o Alexander gasta num ano, o Ronaldo Fenômeno, por exemplo, deve ter gasto em apenas uma das suas festas de casamento. E não é exclusividade dele. Jogadores de futebol e artistas da música e da TV adoram exibir suas conquistas. E quase não se vê críticas quando isto acontece.

Recentemente surgiram os tais “funkeiros ostentadores”, que ao emplacarem seus sucessos têm conseguido uma quantidade boa de shows, o que os proporciona manter um padrão de vida do mesmo nível do tal do Alexander, e com atitudes parecidas com as dele. Mas ao invés de receberem as mesmas críticas pela ostentação (vamos esquecer a questão musical), acontece o contrário, existiram até programas de TV e blogueiros analisando como um fenômeno sociológico a tal “ostentação”.

A incoerência acontece quando as pessoas que sempre exaltaram um jogador de futebol ou um artista, por ter saído de uma “condição humilde” e ter se superado na vida, julgam uma pessoa que, aparentemente (ninguém sabe a história do cara), teve algumas chances a mais, usando outro peso. Quando diz que é empresário então, já taxam de explorador, corrupto, etc. Isto é preconceito. Do mesmo tipo que dizer que favelado é tudo bandido, ou que gay é tudo promíscuo.

O ser humano gosta de se destacar no meio da multidão e exibir suas conquistas. Antigamente era o mais forte, o mais apto à caça, depois o que tinha mais posses, ou o que fazia parte da nobreza ou do clero. Natural que, no caso das pessoas que possuem mais dinheiro, este seja o meio de exibir. É só ler um pouco de Maslow que facilmente se percebe que isto não é apenas um comportamento de um “rico babaca”.

Pirâmide das necessidades do ser humano de Abraham Maslow. | Créditos: gestaonossadecadadia.com.br

O segundo ponto que me chama a atenção é a relação que o Brasileiro, assim como os demais povos de origem latina, têm com o dinheiro. Vamos primeiro tentar explicar o que é o dinheiro.

Dinheiro é apenas um meio de troca. Antigamente, quando as pessoas trabalhavam no campo e em atividades extrativistas, o excedente conseguido era trocado com vizinhos por outros produtos de seu interesse. Para facilitar a troca, já que muitos destes produtos eram perecíveis e/ou tinham um volume e/ou peso muito grande para ser carregado de um lado para o outro, as pessoas inventaram meios de facilitar esta troca. Um dos meios mais conhecidos foi o utilizado durante o Império Romano, onde os soldados recebiam do Império sal como pagamento por seus serviços, e utilizavam este sal para adquirir outros produtos de seu interesse. Daí vêm as palavras “salário” (de sal) e “soldo” (de soldado) para designar pagamento por trabalho.

Atualmente, onde as ideias, conexões e influência (E por que não sorte?) geram mais valores do que o trabalho braçal (que pode ser substituído por máquinas), faz mais sentido ainda ter um meio de troca.

Portanto, uma pessoa que tem muito dinheiro (partindo do princípio que ela ganhou honestamente), é apenas uma pessoa que conseguiu gerar muitos frutos do seu trabalho e, portanto, não deveria ter vergonha de tê-lo ou demonstrar tê-lo. Nos EUA, Canadá e em vários países europeus, as pessoas se orgulham de ganharem mais e não tentam esconder isto, pois é sinal que a pessoa gerou bastante riquezas à partir do seu trabalho.

Porém, e acredito muito que devido à influência da Igreja Católica (Dinheiro é pecado! Nos entregue que nós nos livramos dele para vocês!), nos países latinos, dinheiro é visto como algo sujo, vergonhoso, algo que as pessoas devem evitar. Se não for possível evitar de ganhá-lo, então “compartilhe” com as demais pessoas.

Como consequência, ouvimos frases do tipo: “com tanto dinheiro assim, ele tinha que distribuir”, “porque ao invés de gastar com baladas, não doa aos pobres”. Se você tem a caridade como princípio de vida e isto faz bem pra você, ótimo. Talvez ele não tenha, e não é demérito nenhum.

Erroneamente, sempre levam a questão para esse lado.

 

E aí caímos no terceiro ponto que me chamou a atenção. E este eu acho particularmente muito perigoso. Vi muitas pessoas dizendo “coitado, ele não é feliz”, “podia fazer tal coisa que iria ser melhor”, “não deve ter amigos”.

Quem disse que o que é bom para você tem que ser bom para todo mundo? Quem disse que “ter amigos verdadeiros” é bom para ele? Talvez ele prefira estes amigos de ocasião e seja feliz desta forma.

As pessoas têm que entender que cada pessoa é um indivíduo, que tem seus valores, princípios, ideologias. E repetindo: desde que não faça mal a mais ninguém, nenhum valor ou princípio é melhor do que o outro. São só diferentes e devem ser respeitados.

Só lembremos que muitas das desgraças que ocorreram na humanidade, tais como guerras, ditaduras, genocídios, entre outros, aconteceram quando um grupo decidiu que a sua ideologia política, a sua raça, o seu intelecto ou a sua religião eram melhores do que a das outras pessoas (mesmo que estas outras fossem maioria) e decidiram impô-los às estes demais. Ou então eliminar quem se opusesse.

Quanto à mim, a única coisa que achei foi graça. Tanto que li a matéria na internet e assisti o vídeo umas três vezes. Mas ao menos eu escolhi assistir ao vídeo, e não foi alguém, dentro de um transporte público coletivo, que resolveu me “presentear” com a exibição

Be happy! 🙂

Wanderlust #38 – PCH (Pacific Coast Highway) e San Luis Obispo, Califórnia (3/51), Estados Unidos

Ventura: a onda corre perpendicularmente ao calçadão da praia.

O trecho da Pacific Coast Highway, também conhecida como State Route 1 (SR 1), ou PCH para os locais, entre Los Angeles e San Francisco deve ser, muito provavelmente, a “road trip” mais percorrida dos EUA. Apesar da Rota 66 ser mais conhecida (ela tambem termina – ou começa, vai saber – em Los Angeles, especificamente no pier de Santa Monica), o trajeto da Rota 66 é mais longo e com menos atrações turísticas não ligadas diretamente à uma road trip.

Como nunca tinha ido até San Francisco (shame on me!), que desta vez estava no roteiro, colocamos este passeio na programação. Para nao ter que dirigir mais de sete horas direto (tem um caminho mais rápido, que leva umas 6 horas, mas a paisagem não é tão legal) e para poder parar em alguns pontos de interesse, adicionamos um pernoite em San Luis Obispo.

Saindo da cidade de Los Angeles, já existem algumas praias bem interessantes que valem uma parada. Sunset, Topanga, Malibu, Point Dume, Zuma Beach, Leo Carillo (esta vale até para passar algumas horas), Dana Beach, além de algumas outras, são recomendações que eu daria. Mas desta vez resolvemos subir direto até Ventura e iniciar a trip à partir dali.

Nunca havia parado em Ventura. Me parece uma cidade bem legal inclusive para passar uns dias. Tem um ar jovial. Achei muito interessante o calçadão denominado Surfers’ Point at Seaside Park, em Downtown Ventura: as ondas se formam perpendicularmente à este calçadão, então dá pra ver os surfistas a poucos metros de distância.

De Ventura, partimos para Santa Bárbara, que é uma cidade de veraneio onde, aparentemente, o pessoal mais “de grana” vai passar as férias e feriados. Por isto, ela tem uma estrutura bem turística: vários restaurantes, serviço de aluguel de bikes e até aqueles “bondinhos” que são comuns em praias brasileiras.

De lá, seguimos direto para San Luis Obispo (aka SLO), pois queriamos chegar ainda de dia para podermos conhecer a cidade. Não vou dizer que foi uma idéia ruim, mas também não foi um passeio que valeu a pena.

Por ficar quase no meio do caminho entre LA e San Francisco, SLO nasceu (em 1856) e se desenvolveu como um ponto de parada para as pessoas que se deslocam entre as duas grandes cidades. Então a cidade até conta com uma rede hoteleira (para este propósito, ou seja, hotéis e motéis simples, para pernoite), restaurantes e algumas lojas. Hoje em dia a California Polytechnic State University, baseada na cidade, traz um outro público. Mas pra ter idéia do “potencial turístico” da cidade, a maior atração é um beco onde as paredes são forradas de chicletes mastigados (isto mesmo!). Tá bom, tem a Mission San Luis Obispo de Tolosa, uma missão católica que deu nome à cidade.

Valeu o descanso (até porque, algumas supresas aconteceriam no restante do trecho, conto abaixo) e para conhecer a Central Coast Brewing, que além de ótimas cervejas, tem um “deck” bem aconchegante. Também deu para conhecer a SLO Brew, que até tem umas cervejas legais, em um ambiente gigante, mas como fomos “expulsos” (pra variar!) do local, a experiência não foi as melhores.

No dia seguinte era hora de continuar a viagem. Já haviamos mapeado alguns pontos interessantes e o primeiro era Morro Bay (resolvemos pular a praia de San Luis Obispo, por ficar afastada da cidade), outra cidade de veraneio, que conta com um calçadão bem legal, além de uma ótima vista do morro que dá nome à praia. Pelo que vimos na cidade, parece que rolam bastante eventos por lá durante o ano todo.

Seguindo a viagem, fomos decidindo o que fazer e paramos novamente em Cambria. A praia é bonita, mas fica meio que num conjunto residencial. Então foi só tirar fotos e “pé na tábua”. As paradas seguintes seriam Ragged Point, Gorda, Lucia, Big Creek (pois queria parar na Rocky Creek Bridge para umas fotos), Big Sur, Point Lobos, Carmel-by-the-Sea, Monterrey e, se desse tempo, Santa Cruz e San Jose, antes de chegar em San Francisco.

Mas em Ragged Point tivemos duas surpresas, uma boa e outra nem tanto. A boa é que Ragged Point é um daqueles lugares de tirar o fôlego, de tão belo. Do alto de um morro você enxerga a encosta toda esverdeada, que parece que foi pintada para combinar com o mar lá embaixo. Uma pena que estava um vento gelado e quase não conseguimos ficar, apesar do sol. E como nem tudo são flores, uns 200 metros a frente de Ragged Point avistamos um bloqueio, ao perguntar para o funcionário o que ocorria, fomos informados que, devido às chuvas de inverno, parte da encosta havia desmoronado e a PCH estava interrompida. O desvio mais próximo ficava a 40 milhas na direção de onde viemos e, contando com o trecho que teriamos que percorrer para chegar num ponto em que poderiamos voltar para a PCH, perdemos umas tres ou quatro horas.

Paciencia, faz parte! Mas tivemos que abandonar parte da programação e, devido ao imprevisto, acabamos tendo tempo apenas de passar por Carmel-by-the-Sea (praia interessante, lembrando bastante as praias do nordeste brasileiro) e Monterrey, uma cidade de veraneio que me surpreendeu pelo tamanho e estrutura.

Fiquei com vontade de conhecer os outros lugares, mas como já tinhamos planos em San Francisco (próximo Wanderlust, que não sei quando sai), não daria tempo de voltar e perder mais duas ou três horas de estrada, sem falar no cansaço.

Observações, dicas e considerações:

  • Fiz o trajeto indo de Los Angeles para San Francisco, mas acho que fazer no sentido contrário (descendo de San Francisco para Los Angeles) é melhor, pois além de estar mais perto da costa, fica mais fácil para parar de sopetão, ao avistar um lugar legal.
  • Por outro lado, existe um pouco mais de “perigo” na descida, pois em várias partes você está dirigindo na beira de um penhasco, sem guardrail ou acostamento. Portanto, precisa de muita atenção.
  • Os melhores meses para ir são entre Junho e Novembro: o tempo está agradável (não que faça muito frio na Califórnia, mas no inverno dá pra esperar algo como o inverno de São Paulo) e as chuvas de inverno já terminaram há uns 3 meses, o que dá algum tempo para que as obras de recuperação das vias sejam concluidas (no caso de interrupções por conta de deslizamentos).
  • É sempre bom dar uma pesquisada no Google para ver se existe alguma interdição na PCH. Comemos bola neste ponto (nem imaginávamos!).
  • Para quem gosta de dirigir, a Topanga Canyon Road, que começa PCH, na praia de Topanga Beach, e vai ate Canoga Park, já no San Fernando Valley, é uma boa pedida. A estrada é bastante sinuosa (mas com boa sinalização e visibilidade) e com uma bela paisagem. Depois dá pra voltar pra LA pela 101 e 405 ou pegar alguma outra estrada pra voltar para a PCH (ou mesmo seguir direto até Ventura pela 101, e ai perde-se as praias de Malibu).

Be happy 🙂

Boardwalk em Ventura Downtown

PCH

Santa Barbara

A principal atração de San Luis Obispo: um beco cujas paredes são cobertas por chicletes mastigados!!!

A bela Morro Bay

Cambria

Cambria: bela praia, mas só isto!

Pé na estrada!

Ragged Point!

Pegando o desvio =(

Carmel-by-the-Sea: lembra muito as praias do nordeste brasileiro

Monterey: uma “grande” cidade de veraneio.

Ragged Point: uma pena que uma foto não consiga capturar toda a beleza do local. Mas fica na memória um dos lugares mais belos que eu já conheci.

 

É sempre mais fácil achar que a culpa é do outro – #tbt

Originalmente publicado na Feedback Magazine, em 20 de Outubro de 2013. As opniões do texto não refletem, necessariamente, a minha opnião atual, já que eu sou um ser em constante evolução e que prefere “ser esta metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opnião formada sobre tudo”.


Tomei emprestada a frase do título da música “Por Quem os Sinos Dobram”, do mestre Raul Seixas, para falar de um assunto que dominou as redes sociais, os portais de notícias, os telejornais e outros meios nos últimos dias: o vídeo, filmado pela vítima, em que um assaltante é baleado após uma tentativa de roubo de uma motocicleta.

O assalto foi filmado por uma câmera no capacete da vítima.

Discordo da “socialização” da criminalidade, como muitos gostam de fazer, atribuindo todos os problemas de segurança pública à condição social. Particularmente, por ter crescido em um bairro da periferia de São Paulo, onde moro até hoje, entendo que não é a condição social, falta de oportunidades ou qualquer outro motivo do tipo que faz uma pessoa se tornar um criminoso. Estudei com várias pessoas que passavam privações de todos tipos e que não se tornaram bandidos, assim como conheço alguns que, à despeito de terem muitas oportunidades, resolveram se enveredar por este caminho.

Não sou psicólogo ou sociólogo para explicar quais os motivos que levam alguém a escolher uma vida destas, mas por conclusão creio que as pessoas são ou não más e, no máximo, a condição social ou algum estado de privação apenas contribui, não sendo o motivo principal, para alguém “escolher” este caminho. Tanto que se fosse apenas uma questão socioeconômica, não teríamos criminosos entre as classes mais abastadas e/ou em países onde estes problemas sociais são praticamente inexistentes.

Entendo que a ação do policial foi corretíssima, assim como acho que o ladrão assumiu o “risco do negócio” e todos que assumem riscos têm que arcar com as consequências. Simples assim.

Mas o que mais me chamou a atenção, especialmente nas redes sociais, é a hipocrisia das pessoas. Boa parte dos “cidadãos de bem” que engrossam o coro de “bandido bom é bandido morto” são pessoas que tem o hábito de adquirir produtos em locais onde, conhecidamente, a origem dos produtos é no mínimo suspeita. Alguns deles até se vangloriam de adquirir produtos “na boca” por preços bem abaixo dos praticados em lojas. Alguns deles também têm o hábito do uso de substâncias ilegais para “fins recreativos”.

Só existe “mercado” para este tipo de produto, que geram ações como a dos criminosos e reações como a do policial, porque existe demanda. Isto é puro princípio econômico.

Acho que falta à muitas pessoas assumirem que, ao comprar um produto fruto de roubo ou furto, de contrabando ou pirataria, e mesmo aquele que “apenas” fuma a sua maconha nos finais de semana, também puxa o gatilho, tanto do policial, quanto o do marginal.

Como diria o Capitão Nascimento: “É você, playboy, quem financia esta merda”.

Cena de Tropa de Elite, onde o icônico Capitão Nascimento dá lição de moral em um estudante viciado.

Be happy! 🙂

Manual de Pintura e Caligrafia – José Saramago (07/2017)

Comprei este livro (e mais dois do Saramago) numa visita a Livraria Lello, no Porto, em Portugal, considerada por muitos a livraria mais bela do mundo. Acabei comprando mais por uma obrigação moral (já que estou com uns doze na lista): visitar uma livraria e não comprar um livro, como fazia quase a totalidade dos visitantes (mesmo tendo um “rebate” do valor da entrada na compra de livros) é um pecado.

Segundo a descrição na contracapa, o livro é uma obra autobiográfica do Saramago. Não tenho conhecimento da biografia deste grande autor (vencedor do Nobel de literatura em 1998), portanto não tive capacidade de associar trechos do livro com a vida dele. Talvez foi uma falha minha não ter tentado saber um pouco mais sobre o autor antes de ler o livro.

De qualquer forma, mesmo como uma “estória” é um livro bastante interessante: ele conta, em primeira pessoa a estória de um pintor retratista (destes que fazem quadro com imagens de pessoas reais) que, em meio a uma crise de meia idade (o livro dá a entender que o pintor se encontra na faixa dos 40 anos, por ter 20 de profissão e não ter terminado a faculdade de belas artes) e a um momento político conturbado em Portugal (o presidente era Marcelo Carneiro, substituto de Salazar no chamado Estado Novo português, a ditadura que durou até 25 de Abril de 1974, fato relatado na última página do livro, que começara a ser escrito um ano antes) começa a se aventurar por outra arte, a da escrita. Genialidade do Saramago ele se “retratar” (sem trocadilho) como um pintor que vai se aventurar justamente na área que ele dominava.

O personagem começa a aprender das artes e oficios da escrita, enquanto faz um apanhado da sua própria vida até então, analisando a sua criação,  seus relacionamentos, seu papel no mundo, enfim, fazendo uma longa sessao de autoconhecimento que o leva a, inclusive, se redescobrir como um artista plástico.

Interessante notar a cabeça a muito a frente do tempo de Saramago. 

O livro não é melhor que o “Ensaio Sobre a Cegueira” ou “As Intermitências da Morte”, mas ainda é um Saramago e, como sempre, uma ótima leitura.

Be happy 🙂

Wanderlust #37 – Los Angeles, Califórnia (3/51), Estados Unidos

Huntington Beach: 21 anos de diferença (1996 e 2017). Até as bandas que eu gosto mudaram!

“Tu não podes tomar banho duas vezes no mesmo rio, pois aquelas águas já terão passado e também tu já não serás mais o mesmo.” – Heráclito de Éfeso

Desde 2008, quando passei uma temporada na cidade (algumas info adicionais aqui), Los Angeles se tornou a minha cidade pra se morar. Tipo assim: se me dessem a oportunidade de escolher qualquer cidade do mundo para morar para o resto da vida, sem possibilidade de trocas, até a pouco tempo não teria hesitado em apontar LA. Mesmo amando São Paulo, tendo uma paixão recente pelo Rio e de ter conhecido, desde então, Berlin (que pra mim ainda é a melhor cidade do mundo no quesito geral).

Los Angeles é cosmopolita (como São Paulo e New York), tem muitas belezas naturais e ótimas praias (como o Rio de Janeiro) e é tolerante e cultural (como Berlin, com a vantagem de ter um clima melhor).

E é o lado cosmopolita da cidade que talvez esteja me afastando dela (neste sentido de talvez não achá-la mais o “melhor lugar para se morar”). Los Angeles é ampla, muito ampla. Entre o extremo sul do condado (la por Huntington) e o extremo norte (Calabasas) sao mais de 200 quilômetros. De leste a oeste a distância também é grande e, por exemplo, do alto do Griffith Observatory já não se consegue enxergar o mar.

Como toda a vida econômica, cultural e educacional se concentra numa pequena parte desta área imensa, alguns problemas são críticos na cidade: o custo de vida nesta pequena área é altíssimo, isto acaba empurrando as pessoas para áreas mais distantes e como o sistema de transporte público ainda é limitado (apesar da visível melhora dos últimos 10 anos), o trânsito é caótico durante quase todo o dia, todos os dias, incluindo os finais de semana.

Então quando cheguei desta vez em LA, depois de ter passado por Huntington Beach (uma das praias mais movimentadas, mesmo estando longe da região “central” do condado) e por Long Beach (uma das maiores cidades do condado, que mereceria mais a minha atenção), a primeira sensação foi de que hoje eu já não encararia gastar duas ou três horas do meu dia dentro de um carro para ir e voltar do trabalho. Como também não teria condicoes de bancar o custo de viver em Venice ou Santa Monica. E como fora desta área as opções para trabalho já são mais limitadas, dificilmente seria um lugar em que eu “investiria” uma mudança.

Mas voltando ao passeio, depois da viagem desde San Diego e a road trip pelas praias que ficam no caminho entre as duas cidades, era hora de visitar, novamente, o lugar em que eu batia cartão em 2008, o Britannia Pub. A viagem foi planejada para que passássemos um domingo em LA para podermos ir ao pub ver uma apresentação da “Number 9”, uma tribute band de Beatles que eu ia assistir quase todos os domingos. O bar já não é mais o mesmo (o público na época era mais descontraído e desta vez o pub crawl Santa Monica passou por lá, gerando algum incômodo) e a banda em sí já não tem a mesma pegada. Mas ainda assim tem as figurinhas de sempre: o bartender Richard dando sua canja, L.J., e mais alguns que sempre batem cartão. Valeu pela memória afetiva.

Na segunda foi dia de levar a Lu para turistar: Hollywood Bowl (dizem que é o melhor lugar para ver o supervalorizado letreiro de Hollywood) e o Griffith Park (e o observatório) de onde também se tem uma vista do letreiro, que repito, é supervalorizado (a Lú teve a mesma reação de “é só isto?” que eu tive em 1996).

Depois fomos fazer as praias ao sul de  Los Angeles que ficaram faltando no domingo:

  • Redondo Beach: tem um pier bem grande e até conta com mais atrações que o de Santa Mônica (mais restaurantes e sem o parque, que também não é lá estas coisas).
  • Hermosa Beach: praia bem simpática e com ótima infraestrutura. Daria até pra pensar em ficar alguns dias numa próxima vez. Detalhe: o tabaco é banido na cidade e é proibido fumar em qualquer área pública. Mesmo em áreas privadas (casas), a fumaça ou o cheiro não podem incomodar vizinhos e transeuntes.
  • Mission Beach: também tem uma boa infraestrutura e parece ser um lugar não só pra veraneio, mas onde as pessoas moram. Estava bem cheia para uma segunda feira.

A próxima parada/praia seria Venice e claro que no caminho passamos por Marina Del Rey para rever o lugar onde morei. Venice é um lugar para perder algumas horas andando e observando a “fauna” local (turistas, artistas de rua, locais, skatistas, etc), bem como seu habitat (bares, lojas, feiras, etc). Infelizmente estava ventando demais e tivemos que abortar a missão. Fomos deixar o carro no hotel e depois andamos até Santa Mônica. Já haviamos passado no 3rd Street Promenade (um shopping a céu aberto, com bastante movimentação, artistas de rua, etc) no domingo, antes do Britannia, por isto fomos diretos para o Pier para podermos assistir o pôr-do-sol. Depois paramos num Biergarten (Big Dean’s Oceanfront Cafe) que tem por ali para tomarmos umas cervejas e comermos algo.

Na terça feira, resolvemos não sair de carro e pegamos um ônibus até Venice para “refazer” o passeio que havia sido interrompido pela ventania. Um ponto importante aqui: hoje já dá pra se virar bem com transporte público em Los Angeles e o que ficar mais inacessível (Hollywood Bowl e o observatório, por exemplo) pode ser feito de Uber ou Lyft. Como disse, o calçadão de Vênice é pra se perder algumas horas (e é um dos melhores lugares para souvenirs também) e fomos andando até Santa Mônica, passando por Ocean Park, a praia / parque que separa as duas mais famosas praias de LA. Uma caminhada de quase 5 kilometros.

De Santa Monica pegamos o metro para ir até Hollywood Boulevard, onde ficam a famosa “Calçada da Fama” e o Chinese Theater (aquele onde os artistas deixam suas pegadas). Não é aquele passeio fenomenal, mas eu acho que é algo obrigatório pra se fazer em LA. De lá, metrô novamente e fomos para downtown. Como havia falado no artigo de 2014, downtown vem passando por um processo de revitalização e, apesar de não ser uma das melhores atrações que a cidade tem a oferecer, tem lá seu charme. O Grand Central Market é um dos lugares que, agora revitalizado, se tornou “cult”.

Estávamos decidindo o que fazer a seguir e procurando opções quando, sem querer, descobri que havia um bar da Mikkeller em Downtown LA, pertinho de onde estávamos e perto da estação onde deveriamos pegar o metrô de volta para o hotel. Nem hesitamos muito para encerrarmos nossa passagem por uma cidade pela qual eu sempre terei um carinho fazendo algo que eu aprendi a fazer justamente nesta cidade: apreciar cervejas diferentes.

Tudo muda, as cidades mudam, as situações mudam, mas principalmente as pessoas mudam. Desde 2008 a cidade mudou bastante, mas eu mudei ainda mais: conheci outros lugares, tenho outros valores, estou vivendo uma outra situação. Hoje Los Angeles talvez perderia pra San Diego (ou mesmo San Francisco) o posto de “lugar para se morar para o resto da vida”. Mas a Califórnia ainda continua imbativel. E ganhou mais pontos ainda com a extensão desta viagem, que fica para os proximos Wanderlusts.

Observações, dicas e considerações:

  • Nos EUA é comum o garçom ou barman vir de tempos em tempos perguntar se esta tudo bem, se quer mais alguma coisa, etc. Quando voce senta em mesa, é praticamente certo que após algum tempo o garçom ja trará sua conta. O que nunca havia reparado é que os sistemas dos bares é feito para isto: quando voce pede algo, ele deixa seu status como verde, depois de um certo tempo o status passa para amarelo e é nesta hora que o garçom vem verificar se voce precisa de algo mais. Se voce pedir algo, ao entrar o pedido, o status volta novamente para o verde e o ciclo se reinicia. Porém, se não entrar pedido na mesa ou conta, depois do amarelo, o sistema muda pra vermelho, ou seja, o cliente está ali dando prejuízo, pois esta ocupando espaço sem consumir nada. É nesta hora que o garçom vem te expulsar…..hahaha
  • É chato para o cliente, mas do ponto de vista do “negócio” o sistema é interessante. Mas ele é meio burro num sentido e situação: quando o bar está vazio, é melhor voce ter uma “possibilidade” de consumo (alguém que esta lá e pode, a qualquer momento, fazer um pedido), do que simplesmente eliminar esta possibilidade mandando o cliente embora. Mas como os americanos já são acostumados, são poucos os lugares que não seguem este sistema à risca (preferindo ficar vazios) e são pouquíssimas pessoas que reclamam (geralmente os gringos).
  • Ande sempre com moedas para o parking. Apesar da maioria dos parquímetros aceitarem cartão, fica mais fácil estender o tempo programado com moedas.
  • Como citei, o transporte público de Los Angeles (e da Califórnia em geral) melhorou muito nos últimos 10 anos. Com o advento dos aplicativos de serviços de transporte individual privado, um carro já não é mais obrigatório para visitar a cidade, como era há uns 10 anos.

Be happy 🙂

Huntington Beach

Richard e sua tradicional canja com a Number 9 no Britannia Pub – Santa Monica

Griffith Park

Redondo Beach

Mission Beach

Genios no grafite de Venice Beach

Santa Monica vista do pier

Venice Beach

Ocean Park

O pier de Santa Monica

Grand Central Market, Downtown LA

Mikkeller Downtown LA: 40 torneiras (+ 2 casks + 5 torneiras de vinho) de Mikkeller e do melhor das cervejarias californianas.

Wanderlust #36 – San Diego, Califórnia (3/51), Estados Unidos

San Diego Bay

Como havia dito no post da minha visita a San Diego de 2014, este foi o primeiro lugar que eu conheci fora do Brasil, lá nos meus 19 anos. A cidade tem mudado muito, mas eu também tenho mudado, então algumas coisas acabaram por me surpreender novamente.

O sistema de transporte público da cidade esta muito mais abrangente. Hoje um carro já não é essencial para visitar a cidade e dá pra se virar bem com a rede de transportes atual e Uber / Lyft. A mudança de mentalidade em relação à mobilidade urbana é gritante na California em geral: em pouquissimo tempo (de 2008 pra cá) as cidades se organizaram e as pessoas mudaram seus habitos.

Como uma coisa puxa a outra, a cidade está mais bem preparada para quem se locomove a pé, com revitalização de bairros antes “perigosos” (ocupar o espaço público é uma das melhores formas pra combater a criminalidade), bares e restaurantes abertos e/ou com mesas na calçada, praças e até uma feira livre. Little Italy (um dos melhores lugares pra se hospedar), Downtown e o Gas Lamp district são os melhores exemplos desta mudança.

Outra coisa que me chamou a atenção foi o movimento cervejeiro local. Em basicamente todo bairro tem um brew pub, inclusive alguns já ícones da recente escola cervejeira americana, como a Ballast Point e a Coronado.

Como era a primeira vez da Lu na California, basicamente fiz o mesmo roteiro de praias que fiz em 2014, e só troquei o USS Midway pelo Gas Lamp District.

Tambem fomos passear por uma manhã no Balboa Park, o principal parque da cidade, que também conta com uma série de museus.

Na subida pra Los Angeles, fomos passando e parando em algumas outras praias, algumas que eu já queria parar (pra conhecer ou rever) e algumas escolhidas aleatoriamente. Pra facilitar, vou colocar em tópicos:

  • Torrey Pines: o tempo estava meio fechado e como aparentemente não tinha muitas atrações, resolvemos nem parar. Mas se tivéssemos mais dias na cidade, talvez valeria à pena conhecer.
  • Del Mar e Solana Beach: o tempo ainda estava fechado e uma das faixas estava fechada por conta de uma corrida, então não conseguimos parar também.
  • Encinitas: esta escolhemos aleatoriamente. Interessante: as casas ficam em cima de uma encosta e tem um baita escadão pra acessar a praia. O tempo ainda estava meio fechado, mas deu pra ver que é uma das mais requisitadas da região, principalmente por surfistas.
  • Carlsbad: esta eu já tinha passado em 2014 (e muito provavelmente em 1996), mas nunca parei. Cidadezinha de veraneio, com alguns hotéis, pousadas, restaurantes. Muito simpática. Se tiver oportunidade no futuro, gostaria de passar mais tempo e pernoitar na cidade.
  • Ocean Side: havia parado em 2014 e achei interessante voltar. A praia e o pier são bem movimentados. É uma cidade de veraneio, maior e mais urbanizada que Carlsbad. Outra que valeria a pena para passar alguns dias e pegar uma praia.
  • San Clemente: acabamos só passando por dentro da cidade, fugindo do transito, já que ela não tem acesso ao mar, pois encontra-se atrás de uma base naval.
  • Dana Point: já no condado de Orange County (do famoso seriado OC), umas das praias menos badaladas e propícia para esportes em mar tranquilo (como stand up paddle). Pelo jeito é uma das preferidas de banhistas também. Queria ter parado da outra vez, não sei porque não o fiz, mas desta vez não deixei passar.
  • Laguna Beach: esta é uma das praias mais procuradas de Orange County, principalmente por gente jovem que só quer curtir a praia, e nao “ostentar” como em New Port. Infelizmente não paramos (senão teriamos que pular outras praias por conta do tempo).

Se à partir de 2008 eu vinha considerando Los Angeles a melhor cidade do mundo pra morar pro resto da vida (a melhor na categoria geral ainda é Berlin), depois desta viagem já estou considerando San Diego para o posto. Até porque as mudancas de Los Angeles estão levando a cidade para um caminho diferente do meu, que tambem vivo mudando. Mas falo disto no próximo Wanderlust.

Observações, dicas e considerações:

  • Achamos uma praça John Basilone, o heroi de Raritan (a cidade de menos de dez mil habitantes onde moramos, em New Jersey).
  • O brew pub da Ballast Point lota. Tentamos ir na sexta-feira e estava simplesmente impossível de ficar lá dentro. E como (ainda) não se pode beber em público em San Diego, preferimos deixar a visita pro sábado à tarde. Eles têm até um Biergarten (pra mim nunca será Beer Garden) que é uma boa pedida em dias de tempo ameno.
  • Interessante como a cultura de Biergartens está se disseminando nos EUA. As pessoas querem fazer do ato de ir ao bar mais do que aquele encostar no balcão de madeira e encher a cara de Bud Light. Isto está fazendo até as leis quanto ao consumo de bebida em público e de licenciamento de estabelecimentos que vendem álcool (onde era proibida a entrada de menores de 21 anos) ficarem menos restritas.
  • Se a Ballast Point estiver cheia, vale uma tentativa na Bolt Brewery, uns dois quarteirões pra frente (sentido Downtown). Não tem o Biergarten, mas tem ótimas cervejas.
  • Nos dois brew pubs o sistema é de ir pedir no balcão, inclusive a comida, que depois é trazida pelos garçons (a cerveja você mesmo leva). Eventualmente, dependendo da boa vontade do garçom (de ganhar umas gorjetas) e da lotação, depois da primeira cerveja, ao notar o copo vazio, eles vêm perguntar se quer mais uma. Mas não conte com isto.
  • Passeando pelo Balboa Park vi uma coisa bem interessante: uma barraca de “evangelistas ateus”! Sabe aquelas barraquinhas que se vê em vários pontos de São Paulo com duas ou três pessoas, em trajes “sociais”, um cavalete com uma placa, algumas revistas, etc? Imagino que sejam as Testemunhas de Jeová. Bem, primeiramente também tem nos EUA, Bélgica e Portugal. Mas voltando ao assunto principal: tinha uma barraquinha no mesmo estilo, com vários folhetos pendurados, revistas e algumas pessoas dispostas à conversar sobre pensamento cético, ateísmo, etc. Achei muito interessante!

Be happy 🙂

Imperial Beach – San Diego

Sunset Cliffs – San Diego

Sunset Cliffs – San Diego

La Jolla – San Diego

Balboa Park – San Diego

Ballast Point – San Diego

Praça John Basilone – Little Italy – San Diego

Encinitas

Carlsbad

Ocean Side

Dana Point

Wings of Madness: Alberto Santos-Dumont and the Invention of Flight – Paul Hoffman (06/2017)

Nunca imaginei que um dia iria ler uma biografia do Santos-Dumont. Não que não o ache um personagem interessante e importante para a história, não só do Brasil, como do mundo, pois ele teve participação importante num dos inventos que mudaram os rumos da humanidade. O que sempre me afasta dos “heróis nacionais” é justamente a maneira como o povo em geral trata os brasileiros com algum destaque (esportivo, científico, artístico, político, etc). Ou é uma exaltação exacerbada, ou trata como piada, ou infringe a eles uma cobrança excessiva. Na maioria das vezes as três coisas acontecem alternadamente e, incrivelmente, até simultaneamente.

Imaginei menos ainda que leria uma biografia sobre Santos-Dumont escrita por um americano. Mas a minha amiga Rebeca me presenteou com este livro, que foi uma grata surpresa justamente por fugir da “canonização” que provavelmente ocorreria se o autor fosse brasileiro. Mas que ao mesmo tempo dá o devido valor à importância do bibliografado, enquanto faz algumas correções históricas, todas elas muito bem documentadas.

Também é muito interessante, como toda biografia, como uma fotografia do Zeitgeist, o espirito do tempo, em que o personagem viveu.

O livro começa traçando a árvore genealógica de Santos-Dumont, contando brevemente a história de seus antepassados, desde os avós paternos e maternos, e dá uma atenção especial em como o pai de Santos-Dumont se estabeleceu e fez fortuna. Depois, passa brevemente pela infância do futuro inventor e por sua adolescência até a sua primeira mudança para a Franca.

A partir dai o livro relata de forma detalhada, incluindo muitas citações de publicações e do próprio Santos-Dumont, todo o processo de educação e de contato de um jovem com as novidades de uma metrópole mundial durante a virada de século. Depois começa a detalhar todos os seus experimento e experiências. Interessante notar a forma educada e sem extremismos ou julgamentos que o autor usa para documentar a suposta homossexualidade de Santos-Dumont.

Durante todo o livro, o autor vai contando, paralelamente à historia de Santos-Dumont, o que ocorria na mesma época em relação à aeronavegação, desde os primórdios do balonismo. Então invariavelmente, quando se aproxima de 1906 (o “vôo” oficial do 14-bis ocorreu em 23 de Outubro de 1906), outros inventores que trabalhavam em “máquinas voadoras” também são apresentados, como Samuel Langley e os irmãos Wright. Estes já haviam inclusive iniciado os estudos e experimentos com aeronaves mais pesadas que o ar bem antes de Santos-Dumont, que até o início de 1906 ainda focava em balões dirigíveis.

Assim como boa parte das invenções e descobertas da humanidade, os equipamentos que nos permitem voar também são o resultado de geração e disseminação coletiva de conhecimento: eles se baseiam em várias descobertas anteriores que foram sendo aperfeiçoadas e complementadas por diversas pessoas em diferentes partes do mundo, simultaneamente. Em algum momento, alguma destas pessoas teria a “sorte” de conseguir uma versão funcional do invento ou de realizar a descoberta, ficando desta forma com a glória e marcando seu nome na história (e, em alguns casos, obtendo lucro).

O livro não foge à polêmica (somente para os brasileiros, importante citar), e eu também não vou fugir: Santos-Dumont foi o primeiro homem a controlar um dispositivo de vôo, foi o primeiro homem a desenvolver equipamentos pessoais de voo (os tão sonhados “carros voadores”, e não desenvolveu apenas um, mas dois: um mais leve que o ar e um mais pesado), ganhou diversos prêmios, etc. Mas não foi a primeira pessoa a voar num equipamento mais pesado que o ar.

Além das testemunhas dos experimentos dos irmãos Wright, que ocorriam desde 1903, os avanços apresentados por eles em 1908, quando finalmente (e com todas as patentes garantidas) apresentaram o seu equipamento de forma oficial ao mundo, não seriam possíveis sem vôos anteriores. E não adianta nem alegar que “ah, mas ele não saiu do chão por conta própria”, primeiro porque isto não importa, podia ser um planador, uma asa delta, ainda assim teria atingido o feito de ser o primeiro equipamento mais pesado que o ar a voar, e em segundo, tirando a forca dos próprios motores, as aeronaves dos Wright só contavam com a força da gravidade (quem usava uma catapulta era o Aerodrome do Langley, que nunca chegou a voar). O avião, como existe hoje, tem muito mais dos Wrights do que de Santos-Dumont.

Mas isto, de forma alguma, tira a importância de Santos-Dumont para o desenvolvimento da aeronavegação. Muito pelo contrário, além de todos os feitos citados anteriormente, alguns dos estudos conduzidos por ele e algumas das soluções encontradas quando dos seus experimentos com os equipamentos mais leves que o ar devem ter sido utilizados por outros inventores e construtores, inclusive os irmãos Wright, no desenvolvimento dos seus equipamentos. Até porque Santos-Dumont tornava público todos os seus esquemas e desenhos. Um pioneiro do “open source”.

Be happy 🙂

P.S. o livro traz uma curiosidade interessante: a corda guia. Sabe aquelas cordas que ficam penduradas nos cestos dos balões? Além de servir para “ancorar” o  balão e para guiar o pouso (com a ajuda de pessoal em terra), ela tem a importante função de servir de lastro (ballast, outra curiosidade, esta cervejeira!). Explico: como o hidrogenio é um gás que se expande e se contrai muito rapidamente de acordo com a pressão, quando o balão está subindo, a expansão do gás poderia fazer com que ele “disparasse” para cima numa velocidade muito alta. O mesmo aconteceria durante o pouso: o gás contrairia a ponto de transformar o pouso numa “colisão com o solo”. Porém a corda serve como um lastro: enquanto ela esta no chão, ela nao gera peso para o balão, mas enquanto o balão está subindo, ela vai saindo do chão e gerando peso (lastro), impedindo assim a “disparada”, mesmo enquanto o hidrogênio se expande. O inverso também ocorre: durante o pouso, a medida em que o gás se contrai e acelera a queda, a corda vai sendo “deitada” no chão, reduzindo assim o peso do balão e desacelerando a descida. Solução simples mas genial!!!!