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Wanderlust #33 – Berlin (e Potsdam), Alemanha

A imponente Karl-Marx-Alle e ao fundo a Berliner Fernsehturm

A imponente Karl-Marx-Alle e ao fundo a Berliner Fernsehturm

Eu tinha dito ano retrasado que talvez não voltasse tão cedo à Berlin, apesar de amar a cidade, porque tenho muitos outros lugares para conhecer, porém acabei não resistindo à uma promoção da Alitália e tive que voltar à melhor cidade do mundo.

Alexanderplatz

Alexanderplatz

Como já falei muita coisa sobre a Cidade (aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui), vou fazer um Wanderlust diferente: como desta vez (minha terceira vez na cidade, somando um total de 9 semanas) eu fui acompanhado, eu montei uma programação que incluia pontos turísticos obrigatórios e alguns pontos interessantes que eu ainda não conhecia na cidade (e creio que ainda falta muita coisa para eu conhecer), vou passar uma sugestão de programação de 7 dias na cidade (é o mínimo para se conhecer, e não apenas “passar” por Berlin, e estou incluindo Potsdam).

Estou colocando em dias da semana pela ordem (de Segunda à Domingo), mas pode-se chegar na quarta, por exemplo, e fazer a programação até a próxima terça. Mantendo as programaçòes de Sexta, Sábado e Domingo (especialmente a de domingo de dia), qualquer outro dia pode ser trocado, só prestando atenção às segundas e terças, já que muitos museus fecham nestes dias.

Anhalter Bahnhof

Anhalter Bahnhof

As programações têm entre 4 e 6 horas de duração (exceto Potsdam, que tem cerca de 8 horas, contando o tempo para ir e voltar) para deixar um tempo livre para que se possa explorar a cidade, pois esta é a melhor maneira de se envolver em Berlin. Se puder encaixar a programação entre o final da primavera e o verão, melhor ainda, pois os dias são mais longos e dá para aproveitar mais..

Segunda:
Desça na estação Frankfurter Tor e caminhe pela Karl-Marx-Allee até a Alexandeplatz (cerca de 2kms). A Karl-Marx-Allee foi planejada para ser o local onde ocorriam os desfiles militares do regime comunista (para mostrar ao Ocidente a “imponência” da URSS e seu regime) e foi projetada para ser parecida com Moscou. Os prédio são imponentes e praticamente simétricos. Aqui ficavam a maioria dos principais pontos de lazer e cultural da Berlin oriental (para aqueles que podiam se dar ao luxo de curtir lazer e cultura).

Potsdamer Platz

Potsdamer Platz

Já na Alexanderplatz se encontra a Fernsehturm, a famosa torre de TV de Berlin, de onde se tem visão de praticamente toda a cidade. Dá para comprar o ticket com antecedência pela Web, mas comprando lá a média de tempo de espera é entre 40 minutos e uma hora e ai pode-se aproveitar a espera para tomar uma cerveja no Biergarten da praça. O ideal é tentar subir no horário do por do sol.

Para fechar, se você não tiver conhecido Munique, vale uma passada na Hofbräu Berlin para tomar algumas cervejas e comer comida típica da Baviera ao som das músicas tradicionais desta região. Agora se já tiver ido à Munique ou estiver para ir, pode dispensar. É um programa bem turístico mesmo.

Terça:
Desça na estação Möckernbrücke, cruze o Elise-Tilse-Park até o Tempodrom, que é um ginásio de eventos que tem uma arquitetura bem interessante. Tanto o parque quanto o Tempodrom e a praça de esportes em frente (Sportplatz Anhalter Bahnhof) ficam no local onde se encontrava a antiga estação de trem Anhalter Bahnhof (hoje existe a estação do S-Bahn), que durante a segunda guerra foi uma das três estações usadas para transportar os judeus para os campos de concentração. A fachada principal da estação, que foi praticamente toda destruída pelos bombardeios da guerra, ainda se encontra no local (as estátuas de anjo que a decoravam se encontram na área de trens do Deutsches Technikmuseum).

Tiergarten

Tiergarten

Da Anhalter Bahnhof até a Potsdamer Platz são cerca de 600 metros, boa parte deles sobre o trajeto por onde o muro passava. Potsdamer é o ponto principal onde se nota o esforço de reconstrução de Berlin depois da queda do muro. A praça, que ficou totalmente destruida após a guerra, hoje acomoda uma série de edifícios gigantes e modernos, como a sede da DB (Deutsche Bahn, a estatal que administra as ferrovias alemãs), da Daimler e o Sony Center. Continuando pela Eberstraße, em direção ao Portão de Brandemburgo, a visita ao Memorial aos Judeus Mortos na Europa é obrigatória. Se tiver pique para andar, vale a pena caminhar os 2 kilômetros até a Siegessäule (Coluna da Vitória) por dentro do Tiergarten. Se tiver mais pique ainda, caminhe os 2 kilômetros de volta ao portão de Brandemburgo (vá por um lado e volte pelo outro) e note a cúpula do Reichstag, o Parlamento Alemão. Do outro lado do portão fica a bela Unter den Linden, uma das principais avenidas, cercada por lojas, cafés e hotéis.

Caminhando mais um pouco (e haja pique!) dá para acessar o Gendarmenmarkt, que além de duas belas catedrais, conta com um bonito e enorme teatro. Aconselho a andar pela praça olhando para o alto afim de notar a decoração dos topos dos prédios. Para os chocólatras de plantão, não deixem de passar na Schokoladenhaus Fassbender & Rausch Chocolatiers.

Brandenburger Tor

Brandenburger Tor

Quarta:
Potsdam é a capital do estado de Brandemburgo, região onde se encontra Berlin (nota: apesar de Berlin ficar geograficamente dentro do estado, ela tem o status de “cidade-estado” e portanto uma relação de hierarquia direta com a República Federal da Alemanha) e é colado na cidade (tipo como se fosse São Caetano, ou Diadema, ou Osasco, só que bonita….kkk). Além de alguns fatos históricos importantes (foi lá onde URSS, EUA, França e Grã-Bretanha assinaram o acordo que dividiu a Alemanha e Berlin), tem vários edifícios históricos que, incrivelmente, foram poupados durante os bombardeios. Também conta com o fabuloso parque Sanssouci, com seus vários castelos e jardins e uma supresa a cada esquina. Aconselho muito a visita à cidade e sugiro que o passeio em Potsdam seja feito à pé.

249 Gendarmenmarkt - Berlin - Alemanha

Gendarmenmarkt

Na volta, como será final de tarde, se houver pique de caminhar mais um pouco, a sugestão é conhecer a Kaiser Wilhelm Gedächtniskirche, a famosa igreja “sem teto”. As torres da igreja foram bombardeadas e decidiram conservá-la desta forma e, ao lado, construiram uma outra estrutura para efetivamente realizarem as cerimônias. Ela fica na região da Kurfürstendamm, que pode ser considerada a Oscar Freire de Berlin, com suas lojas de grife e luxo. Ali perto fica a KaDeWe, uma loja de departamentos cuja visita também vale à pena, especialmente à sua seção de alimentos e bebidas, onde pode-se encontrar itens de qualquer parte do mundo.

Lustgarten - Sanssouci Park - Potsdam

Lustgarten – Sanssouci Park – Potsdam

Quinta:
Ir à Berlin e não conhecer a East Side Gallery é um pecado, especialmente para os apreciadores de street art, portanto, aproveite a quinta para ir até lá, descendo na Ostbahnhof. Infelizmente de uns dois anos para cá os visitantes resolveram “deixar sua marca” escrevendo frases e nomes por cima das pinturas, o que tem levado a prefeitura a cercar o muro. Muito triste. Na volta, desça em Hackescher Markt e escolha entre algum dos museus da Museumsinsel ou então, para quem gosta de história, dirija-se diretamente ao DDR Museum, um museu que conta como era a vida na Alemanha Oriental. Ali na mesma região também existem outros museus, mas um outro que eu sugeriria (que não fica na mesma região), se houver tempo, é o Deutsches Technikmuseum, especialmente pela coleção de trens (sim, trens de verdade, e não é um só), barcos e aeronaves. E agora ainda contam com um anexo com automóveis, computadores e mais algumas bugigangas.

Nikolaikirche - Potsdam

Nikolaikirche – Potsdam

Na volta, vale uma passada em frente a Berliner Dom (fica ao lado do DDR e da Museuminsel) e depois se dirigir à Nikolaiviertel, o bairro onde Berlin nasceu. E estando lá vale muito à pena comer e tomar umas cervejas da Georgbraeu.

Sexta:
Além de vários parques, Berlin conta com várias florestas urbanas. Uma bem simpática, já fora da região central da cidade, é a Akazienwäldchen, próxima a estação Blaschkoallee (que também é bem charmosa). Ao lado do parque fica o Murugan Tempel, um templo indiano bastante colorido. Havendo tempo vale a visita.

O que não se pode deixar de visitar em Berlin é o Tempelhof, um Aeroporto que foi transformado em parque. Além da situação interessante de andar por onde trafegavam aeronaves, vale muito conhecer a história da ocupação e consequente transformação em parque.

Depois do Templelhof, a dica é ir até a Mariannenplatz, no bairro de Kreuzberg. A praça também é bem charmosa e é interessante notar que o tipo de iluminação e postes é diferente de cada lado das ruas que a cercam, já que ela ficava do lado oriental enquanto a rua em sí ficava na parte ocidental.

Dalí dá para caminhar até a Oberbaumbrücke, passando pelo Schlesisches Tor, ambos em Kreuzberg. O bairro de Kreuzberg, junto com Prenzlauerberg, sofreu ocupação de artistas, designers e outros profissionais ligados à arte à partir da metade da década de 90, o que transformou o bairro em um local repleto de galerias, brechós, bares, estúdios e casas de show.

Kaiser Wilhelm Gedächtniskirche

Kaiser Wilhelm Gedächtniskirche

E já que falamos em Prenzlauer, a dica para a sexta à noite é fazer um esquenta no Zu mir oder zu dir (pode-se fumar no bar, o que pode ser incômodo para não fumantes. Cães também são permitidos) e depois procurar alguma festa, show e/ou balada na Kulturbrauerei, uma antiga cervejaria (a tradução exata é “cervejaria de cultura”), convertida em um enorme “shopping” de atividades culturais e de lazer. Podem ocorrer, na mesma noite, nos vários espaços, diferentes eventos. E ai fica à gosto do fregues escolher entre uma festa cubana, uma aula de capoeira, uma peça de teatro, um simples jantar ou uma rave.

Na volta, pegue uma cerveja em alguma das “später Kaufen” (as lojas de conveniências) e aproveite para curtir alguma apresentação que provavelmente estará ocorrendo nas escadarias da estação Eberswaldestraße.

Sábado:
Como disse em um dos artigos linkados acima, se você não tomar cuidado pode se perder e gastar seus dias em Berlin apenas visitando museus. A programação que eu estou citando aqui leva entre 4 e 6 horas e ai sobra tempo para que você escolha alguns museus de sua conveniência e encaixe, mas um dos que eu recomendo muito é o Topographie des Terrors, um museu gratuito que conta (com muitas, muitas fotos) toda a história desde a ascenção de Hitler até a queda do muro. Como fica a um quarteirão de Checkpoint Charlie, vale a passada neste ponto turístico para tirar umas fotos.

Akazienwäldchen

Akazienwäldchen

Se curtir carro e tiver afim de gastar uma grana, o passeio de Trabi do Trabiworld (entre o Topographie des Terrors e o Checkpoint Charlie) vale muito à pena.

Para a noite de sábado, a dica é explorar Kreuzberg, iniciando pela Hopfenreich, com suas 22 torneiras com o melhor da recente cena de cerveja artesanal/especial de Berlin. Na sequencia sugiro o Lido, que sempre conta com algumas apresentações bem interessantes, na linha de Soul, Funk, Disco, Jazz e Rap, inclusive de Brasileiros (Criolo, Emicida e Diogo Nogueira são alguns que já passaram por lá). Antes de sair não esqueça de tirar bastante água do joelho para poder aproveitar um pouco das atrações musicais (bandas, rappers, cantores) que se revezam durante as madrugadas em frente à estação Warschauer Straße. Imagino que se tivesse banheiro ali muita gente nem iria se preocupar em ir para as baladas de Kreuzberg.

Domingo:
Este programa deve ser feito justamente no domingo. Primeiramente desça em Hackescher Markt e caminhe pelo James-Simon-Park à beira do Spree no sentido da Neue Synagoge Berlin, outro local icônico de Berlin e da história do holocausto (a entrada só é liberada aos membros da comunidade judaica por motivos de segurança, e ainda assim após passar por um raio-X). Depois dá para ir andando até a Nordbahnhof, onde começa a Bernauer Straße e um museu a céu aberto sobre o muro.

Tempelhof

Tempelhof

A Bernauer Straße é icônica pois foi dividida ao meio pelo muro e várias das cenas e histórias mais conhecidas durante a construção e a existência do muro ocorreram ali: a igreja da reconciliação, que ficava de um lado enquanto seus fiéis ficavam do outro, o cemitério que foi “deslocado” para acomodar a “death strip”, fugas tanto por túneis quanto de pessoas pulando as janelas. Enfim, é uma aula de história e de a que ponto chega a imbecilidade humana.

A Bernauer termina no Mauerpark (Parque do Muro) um parque que “nasceu” depois da queda do muro, justamente na área da death strip e tem uma história de ocupação parecida com a do Tempelhof. Aos domingos ocorre ali um mercado das pulgas onde pode-se encontrar roupas novas e usadas, artesanato, camisas de times de futebol, brinquedos, eletrônicos, memoriabilia, uniformes militares, enfim, praticamente tudo. No mercado também são montadas algumas “praças de alimentação” com “ambulantes” vendendo comida, muitas delas tradicionais de regiões mais desconhecidas da Alemanha.

Mariannenplatz

Mariannenplatz

Saindo do mercado, o parque em sí também é outra atração imperdível, com gente fazendo churrasco, jogando bola, crianças brincando e muitos, muitos músicos, dos mais variados estilos, fazendo música em troca de moedas. No verão ocorre ainda, no anfiteatro do parque, um Karaokê ao ar livre que é fantástico. Passar um domingo no Mauerpark é a receita para sair com um sorriso de orelha a orelha (depois de derramar algumas lágrimas de emoção).

Observações, dicas e considerações:

  • Apesar do Outono na Alemanha apresentar uma beleza e mistura de cores impressionantes, à partir de novembro várias atrações, como as praias e alguns parques, começam a se preparar para o inverno e portanto fecham. Se puder escolher, a melhor opção é ir entre Abril e Outubro.
  • Interessante como quase nenhum estabelecimento oferece wi-fi. Nota-se que o Berlinense quando vai ao bar com amigos, ele vai ao bar com amigos. Se fosse pra ficar no smartfone ele ficava em casa.
  • Aproveite para tirar alguma foto em umas das várias máquinas espalhadas pela cidade. Custa apenas 2 euros e é um belo souvenir.
  • É tanto lugar legal para conhecer e coisas interessantes para se fazer em Berlin que fica até difícil montar um roteiro para apenas 7 dias e tive que “abrir mão” de várias coisas para não sobrecarregar.

Be happy 🙂

East Side Gallery

East Side Gallery

Warschauer Straße: a verdadeira passarela do álcool....hahaha

Warschauer Straße: a verdadeira passarela do álcool….hahaha

Neue Synagoge Berlin

Neue Synagoge Berlin

Mauerpark

Mauerpark

O Verde Violentou o Muro – Ignácio de Loyola Brandão (16/2015)

O Verde Violentou o MuroEm 1982 o autor, após uma separação, aceitou uma proposta do DAAD, instituto alemão de intercâmbio acadêmico, para passar uma ano e meio em Berlin Ocidental. No livro, que tem como subtítulo “A vida em Berlin antes e agora”, ele relata as experiências de viver em uma cidade cercada por um muro (muita gente imagina, como eu imaginava antes de ir à Berlin pela primeira vez, que o país era “cortado” pelo muro, que passava pelo meio na cidade, mas na verdade o muro não dividia a Alemanha e sim cercava a parte ocidental de Berlin, expliquei um pouco aqui).

Depois deste período ele voltou mais três vezes à cidade depois da queda do muro e pode conhecer, com um pouco mais de detalhes, os pedaços do lado oriental da cidade. Como ele apenas visitava o “outro lado” em passeios de um dia, ele não tinha muitos detalhes de como era a vida ali e, ao visitar lugares que estavam atrás do cinza do muro, ele conta como ele imaginava que fosse.

Como ele deixa transparecer, ele parecia estar fugindo de alguma coisa, e como ele afirma em vários trechos, acabou se encontrando por várias vezes na cidade. Não é uma história com início, meio e fim, ou mesmo um relato. É apenas uma coleção de textos pequenos, onde ele relata experiências, curiosidades, observações e eventualmente dá algumas dicas, mais ou menos como eu faço nos artigos que escrevo sobre minhas viagens. É claro que ele tem muito mais bagagem do que eu (pelo fato de ter morado na cidade), além de ter um estilo infinitamente melhor que o meu de escrever. Por isto, a melhor forma de fazer um relato sobre o livro, é colocar alguns trechos que achei interessante (eventualmente com algum comentário meu):

  • “Não entendo conhecer uma cidade sem andar, andar. Cortando ruas, olhando para as casas, vitrines, supermercados, lojas. Tudo.”
  • “A cerveja alemã é mais suave, porém mais amarga que a brasileira. Mais cremosa, mais densa. Impossível encontrar aqui o que se chama no Brasil ‘estupidamente gelada’. Ou aquela que se tem de pedir ao garçom (se for íntimo da casa) ‘Me traz a que o dono guarda para ele!’. Descobri que beber cerveja estupidamente gelada é estúpido, mesmo ao calor de quarenta graus. Somente na Alemanha passei a sentir o sabor da cerveja, o gosto, o cheiro, a perceber as diferenças de paladar que o gelo anula.”
  • “Vá sábado de manhã, o espetáculo é curioso. Classes média e alta se acotovelam e entram em filas. Enfrentam aquilo por horas, sem protestos. Vendo as filas, achei curioso as críticas que costumam fazer a Berlim Leste. Uma delas diz: ‘Imagine, as pessoas têm que formar filas para fazer compras!’. Qual a diferença entre a fila do Leste e a do Oeste? Aqui estão comprando o supérfluo. Acho mais importante a fila do essencial” – sobre a KaDeWe, uma loja de departamentos gigante, ainda existente em Berlin, situada na Kurfürstendamm (ou KuDamm, uma mistura da Quinta Avenida com a Times Square, ambas de Nova Yorque), que oferece de tudo no que se refere à alimentos e bebidas.
  • “Meninas, adolescentes graciosas de vestidos vaporosos, longos, e pés no chão. Adoram andar descalças no verão”
  • “Ela existe, porém se conserva mais a distância. Posso andar sem medo pelas ruas, à noite. Não me incomodo muito se esqueço uma janela aberta. No cinema ou teatro deixo meu casaco guardando o lugar e vou tomar café, no intervalo. Sei que posso quebrar a cara, sofrer qualquer coisa, porém é hipótese, não uma comprovação e uma espera diária.” – sobre violência em Berlin.
  • “O normal nesta região moderna: espaço amplo entre os conjuntos, muita grama, playground com brinquedos imaginativos, bastante árvore e um rio canalizado e urbanizado, cheio de chorões nas margens. O que me fez pensar nos rios brasileiros. Riachos e córregos que atravessam nossas cidades e que os prefeitos enfiam por dentro de um cano, colocando uma avenida por cima, cheia de asfalto e nenhuma vegetação. O dinheiro gasto para aprisionar e fazer desaparecer uma água talvez seja maior do que enquadrar o rio numa paisagem urbana agradável e descontraída.”
  • “Não dá para ficar trabalhando o tempo inteiro, se matando como louco, como fizeram nossos pais, nossos avós. Não queremos competir com ninguém, nem ter os melhores postos, nem vencer brilhantemente na vida. Queremos lazer. Um pouco de trabalho e o resto de divertimento.” – de uma conversa entre jovens ouvida pelo autor.
  • “Política? Quem quer saber de política? Olha o que os políticos fizeram, fazem e estão fazendo a este país! Sou pelos verdes, mas sem política. Sou pela ecologia, sem política. Sou pacifista, sem política. Sou contra os mísseis nucleares, mas não preciso misturar política nisto.” – de uma outra conversa entre jovens ouvida pelo autor.
  • “O alemão confia no Estado para a solução de seus problemas. Se está desempregado, espera o socorro da assistência social, o seguro-desemprego. Se está doente, se tem um problema qualquer, se briga na rua, se alguém fecha o seu carro (ele não dá bronca, comunica à polícia e você recebe a visita dos agentes da lei que cagam regras), se tropeça num buraco, se as coisas não funcionam administrativamente, se o preço é extorsivo. O Estado é o pai, criado para resolver a vida. Sistema profundamente capitalista que vive como socialista. Contradição? Ou encontraram o regime (mais ou menos) ideal?” – pela posição econômica e política da Alemanha e pela qualidade de vida dos seus habitantes, creio que sim, encontraram o equilíbrio entre estes dois extremos, assim como os países Nórdicos, a Austrália e o Canadá.
  • “Hoje é um partido político que se organiza. Provoca polêmica, abre discussões, é amado ou odiado. Para uns, salvação. Para outros, o perigo que vai lançar a Alemanha nos braços da Rússia ou na terceira guerra mundial. Partido em ebulição, heterogêneo. Abriga amigos da natureza, defensores do meio ambiente, pacifistas, antinucleares, rebeldes de 68, leninistas, marxistas, dissidentes de outros partidos, social-democratas, contestadores do sistema, alternativos”. – sobre Die Grünen (os verdes), o partido verde alemão, um dos principais atores que levaram à queda do muro (título do livro explicado!).
  •  “‘Quem é diferente ou quer ser diferente, deve vir para Berlim. Aqui você é normal sendo diferente. As pessoas que não concordam com a visão de mundo que foi imposta a elas por educação e condicionamento se refugiam em Berlin’, escreveu Stefan Schaaf, de vinte e oito anos, jornalista do Die Tageszeitung.” – como em outras parte do livro, me identifiquei muito com as opniões do autor ou de seus interlocutores, neste caso em específico até escrevi sobre a diversidade e o respeito à ela que existe em Berlin neste artigo, bem antes de ler o livro.
  • “Berlim foi aquilo que sempre considerei o ideal para uma cidade. Nem megalópolis, nem província. Oferecendo vantagens e desvantagens das duas. Nesta cidade me reencontrei muitas vezes, divisei luzes e instantes que estiveram dentro de minha vida em determinados momentos. Cidade mágica, complexa, paradoxal, refúgio e verdade. Cidade que é aquilo que queremos que ela seja.” – outro trecho bem parecido com um que escrevi neste artigo.
  • “Recorro, mais uma vez, a Bernard Cailloux, escritor que nasceu na cidade de Erfurt, Turingia, parte oriental e mudou-se para o ocidente antes da divisão da Alemanha. Em 1978, ele radicou-se em Berlin e ‘precisou de dez anos para se adaptar, conhecer e começar a compreender a cidade’. Dez anos para um alemão. Portanto, não esperem de mim a definição de uma cidade indefinível.” – como já disse, Berlin não é para ser apenas visitada e conhecida (muito menos pela janela de um ônibus de excursão), é uma cidade para ser vivida, assim como São Paulo, Nova York e algumas poucas outras.
  • “Muita gente sentia pertencer a uma classe superior ao poder comprar produtos ocidentais. Havia justificativas as mais curiosas, às vezes: ‘O cheiro é diferente, é bom’. Depois da guerra, com a ocupação da Alemanha, a Guerra Fria e o isolamento a que a RDA se viu conduzida, parte da população acabou aderindo ao socialismo por crença, defendeu-o com idealismo. Muitos nasceram dentro do regime, não tiveram opção. Outros viveram inconformados. Sobre a antiga RDA perspassava sempre a utopia: viver do lado de lá ou, ao menos, conhecer, saber como era, poder comparar, ser livre para decidir. Um segmento sonhava em abandonar o país (no Brasil quantos não sonham com Miami, quantos não foram para o Japão?). Todavia, se as fronteiras fossem abertas, a Alemanha Oriental não se esvaziaria, como imaginavam os líderes. Boa parcela da população viveu tranqüila sob o socialismo e não é culpa dela a corrupção da cúpula, que desvirtuou uma idéia. O difícil, depois da queda do muro, disseram Zilly e Hoffman, foi, de um momento para o outro, passar a viver debaixo de normas e regulamentos que não eram os deles, eram opostos, cruéis, pode-se dizer… Após a queda do muro, os problemas se tornaram tão grandes que os antigos problemas se minimizaram. De repente, não existia mais o socialismo, mas também não existia a crença na social-democracia e não se acreditava nos conservadores. Ficou o vazio.” – tenho a mesma opnião sobre Cuba.
  • “Na antiga RDA (ou DDR) o nível de vida era baixo, mas todo mundo tinha emprego, salário, direito a creche, saúde e escola, e assim se sentia ‘parte da grande família’. Agora, o que governava era a concorrência global do mercado e a maior parte do parque industrial da antiga DDR teve que fechar. Tendo vivido décadas isolado, este parque estava desatualizado, desestruturado, arcaico e praticamente sucateado, segundo os conceitos do oeste, incapaz de produzir no ritmo exigido pelo mundo capitalista. Chegou, do dia para a noite, uma onda de desemprego que transformou grandes partes da DDR em desertos industriais, com a população sem emprego, sem o dinheiro necessário para desfrutar do paraíso de consumo e – mais importante – sem o sentido de vida e o prazer da auto-afirmação que o trabalho confere a um cidadão.”. – relato escrito de Sebastian Scherer, alemão casado com uma brasileira e residente de João Pessoa, enviado ao autor e reproduzido no livro.
  • “Quero voltar a essa cidade quantas vezes puder. Sinto que pertenço a ela. Sou paradoxal e incongruente, neurótico e tenso, calmo muitas vezes. Como ela. Continuo sem entender por que entrar aqui me dá paz.” – eu te entendo Ignácio, entendo pois sinto o mesmo.
  • “Para mim, que não encontro um lugar no mundo, inquieto onde esteja, sem descobrir um sentido para a vida, ela continua uma cidade de momentos, de fragmentos que me parecem congelados no tempo e me acompanham.” – sei bem como se sente Ignácio, sei mesmo.

Talvez o autor tenha um saudosismo do período em que ele morou lá, época em que a cidade era dividida, que talvez faça ele “rechaçar” um pouco das neue Berlin. Eu infelizmente não pude conhecer Berlin dividida (a divisão não era legal, mas teve algumas consequencias interessantes, especialmente na formação do povo), mas como dá para perceber lendo o relato dele de 30 anos atrás e comparando com os meus relatos e experiências na “nova” Berlin, a cidade ainda mantem sua aura e sua alma.

Be happy! 🙂

Wanderlust #12 – Viel Danke Berlin!

Viel Danke 1Antes de tudo queria te agradecer por você reforçar meus princípios de aceitar e tratar a todos com dignidade e respeito, independente de credo, etnia, gênero, classe social, idade ou qualquer outra coisa. Talvez esta seja a melhor lição que você dê para o mundo.

Você poderia ser cinza, mas deixa seus prédios e trens serem coloridos por grafites e “lambe lambes” que te deixam mais charmosa. E deixa que suas colunas e pilastras nos apresente sua poesia. Eu não entendo muitas delas, mas ao entender algumas palavras, eu consigo “senti-las”.

Viel Danke 2Você poderia ser barulhenta, mas permite que a música flua por suas vias e trilhos, através de centenas de artistas, muitos deles que tocam só pelo prazer de tocar.

Obrigado por tudo isto!

Obrigado pelos vários sorrisos que seus cães preguiçosos, esparramados no chão dos vagões do seu metrô e trem, “arrancaram” de mim.

Obrigado por suas crianças não terem medo de “estranhos” e sorrirem para eles.

Viel Danke 3Obrigado por seus adultos que falam com estranhos, e quando descobrem que eles vêm do Brasil fazem questão de pagar cerveja para estes estranhos. Aliás, obrigado por gostar tanto da minha terra!

Obrigado por seus velhinhos estarem ansiosos para ajudar alguém que eles imaginam estar perdido, só por estarem segurando um mapa na mão. E obrigado por eles se esforçarem para te entender e se fazerem entender, mesmo que eles não falem uma única palavra de uma língua da qual você têm mais conhecimento.

Viel Danke 4Obrigado por estes mesmos velhinhos estarem dispostos a conversarem com você no metrô, nos parques, nas cervejarias e, vendo que você está tentado aprender o seu idioma, se esforçarem para te ajudar e te corrigir, com toda a gentileza do mundo.

Obrigado por suas centenas (milhares?!?) de padarias. Eu não fiquei chateado por elas não terem coxinha. Mas você até conseguiu me arranjar coxinhas!!!!!

Viel Danke 5Obrigado pelo seu sistema de transporte, que apesar de antigo e às vezes mal cuidado, é eficiente, como tudo que você faz, e te leva para qualquer lugar que se deseje ir. E obrigado por ele funcionar 24 horas aos finais de semana e vésperas de feriado.

Obrigado pelo pão com Nutella no café da manhã. Você me acostumou mal e acho que isto será um hábito para mim daqui por diante.

Obrigado por me ensinar a pegar comida para viagem no almoço, só para me sentar num banco de um parque, ou mesmo na grama, debaixo de uma árvore, e fazer deste momento mais do que simplesmente “se alimentar”.

Obrigado por suas mesas coletivas nos restaurantes, bares e Biergartens, que além de nos ensinarem a conviver mais fora da nossa “concha”, faz com que conheçamos pessoas fantásticas.

Viel Danke 6Obrigado por suas mulheres despojadas, que em outros lugares seriam taxadas de deselegantes, só por se vestirem confortávelmente e abdicarem de maquiagem, roupas apertadas e salto alto em nome da praticidade, mas que nos fazem perceber que a beleza natural é a melhor de todas. E obrigado por elas passarem por nós em suas bicicletas, geralmente com um buquê de flores no cesto.

Talvez você não goste muito dela, pois ela te traz lembranças de um passado ruim que talvez você queira esquecer, mas obrigado pela Fernsehnturm, que é como uma bússola quando se está perdido dentro de você. Basta achá-la que você se localiza.

Obrigado também pela Karl-Marx-Alle. Você talvez não goste dela também, pois ela lhe foi imposta por idiotas que queriam mostrar para o mundo o quanto são “poderosos”. Mas mesmo assim, ela é bela e fascinante.

Viel Danke 7Obrigado por me ensinar a andar sempre olhando pro alto, esperando alguma surpresa aparecer.

Obrigado pelas três semanas de muito calor, muitas vezes acima dos 31 graus, o que não é do seu costume, e pelas poucas chuvas.

Obrigado pelo que foi, até agora, o melhor domingo que eu tive, primeiramente fazendo o melhor city tour da minha vida, à bordo de um dos seus mais ilustres filhos, o pequeno e simpático Herr Grün Trabi, seguido por momentos fantásticos em um dos seus parques mais simbólicos.

Para que eu não me estenda muito, simplesmente obrigado por ser a cidade que todas as cidades deveriam ser.

Como diz um cara da minha terra: “eu tenho uma porção de coisas para fazer e não posso ficar aqui parado”.

A gente se vê novamente. Quem sabe da próxima vez não seja “para sempre”.

Wanderlust #11 – Berlin – Teil 5: Observações, Curiosidades e Dicas.

Berlin 1

O eficientíssimo sistema de trens de Berlin

Ufa, estamos chegando ao final. Este é o quinto artigo sobre Berlin (ainda terá um sexto), mas é que existe tanta coisa para falar da cidade, que se eu colocasse tudo em um texto só, iria ficar muito grande. Neste daqui, à exemplo do que eu fiz nos texto sobre os EUA e Amsterdam, vou colocar um pouco as minhas observações sobre a cidade e o povo e também algumas dicas.

Observações e curiosidades:

  • Conforme já havia falado no artigo sobre Phoenix, nos EUA, os Europeus, assim como os norte americanos, são muito diretos quando querem falar alguma coisa. Não ficam com rodeios, não tentam dourar a pílula, não usam muitas “figuras de linguagem”: falam o que precisa ser dito da forma mais clara e objetiva possível. Isto incomoda um pouco os latinos, pois nós somos muito “mimimi”.
  • O alemão então tem esta objetividade elevada ao extremo. Ele simplesmente não quer perder tempo e gastar energia fazendo rodeios.
  • Por falar em gastar tempo e energia, é impressionante como eles aplicam princípios de eficiência em tudo o que fazem. Alguns exemplos:
    • As portas do metrô e trem são dotadas de botões, portanto elas só abrem se alguém realmente for utilizar. Pensando em apenas uma porta, pode até ser um absurdo, mas imagine centenas de portas de trem e metrô se abrindo milhares de vezes ao dia, o que isto gera de desgaste nas peças, gasto de energia, etc.
    • Da mesma forma, as composições de trêm e metro só são formadas pela quantidade máxima de vagões durante os horários de pico. Fora deles, eles simplesmente “desengatam” dois ou três vagões. Isto deve gerar uma baita economia de energia e de peças. Durante as madrugadas de final de semana, quando o transporte público funciona 24 horas, além do intervalo aumentado (em média 15 minutos entre um trem e outro), eles circulam com apenas 2 vagões, o suficiente para atender aquela demanda.
    • Quando fui para Wolfsburg também fiquei impressionado com o trem que se “divide” no meio do percurso. Deixa eu tentar explicar: existem dois trens que fazem boa parte do mesmo caminho, porém em determinado ponto um segue uma linha e o outro outra. Ao invés de cada um circular sozinho, eles “engatam” os dois trens, economizando assim energia, reduzindo o atrito, etc. Quando chega no ponto certo, eles simplesmente se separam (em movimento) e cada um segue o seu caminho.
  • A mulheres alemãs, no dia a dia, também não perdem muito tempo com maquiagem e preferem usar roupas confortáveis, pelo mesmo motivo: praticidade e conforto. Difícil ver uma com roupa muito justa, ou salto alto, por exemplo. Talvez este também seja o motivo para várias adotarem um cabelo bem curto (estilo joãozinho mesmo).
  • Uma das coisas que eu mais acho legal na Alemanha são as mesas coletivas em bares e restaurantes. Isto faz com que você tenha mais oportunidades de conhecer novas pessoas. Aliás, eles gostam muito de atividades coletivas. Neste ponto eles estão muito, mas muito na frente de nós, brasileiros, como sociedade.
  • Indo para um bar para assistir um jogo, passei por uma comunidade hippie em plena Berlin. É simplesmente um terreno que ocuparam e começaram a construir barracos, dividem a comida, roupas, as pessoas vêm e vão, existem festas e é tudo aberto. Para quem estiver na cidade e tiver oportunidade, fica próximo à Cuvry Straße.
  • Uma coisa que eu notei desde a primeira vez que fui à Europa, em 2011, foi o quanto os europeus gostam de aproveitar atividades ao ar livre durante o verão (só fui à Europa três vezes e as três no verão, então não saberia dizer se no inverno acontece o mesmo). Eles evitam até mesmo almoçar, durante o expediente, em restaurantes fechados, preferindo mesas na calçada e muitas vezes pegando a comida para viagem e se sentando num banco, ou mesmo na grama de um parque ou praça para comer.
  • Desde que comecei a andar de Bicicleta, além do Brasil, visitei mais três países: EUA, Holanda e Alemanha. A Alemanha é o único lugar em que o ciclista respeita as leis de trânsito e os pedestres. Nos outros países eles são tão maleducados (até mais, no caso da Holanda), quanto os brasileiros.
  • Durante uma das aulas caímos no assunto do Zivildienst. Lá na Alemanha (e também na Suiça), o serviço militar (Militärdienst) é obrigatório, assim como no Brasil, para todos os homens, e dura oito meses. Porém, quando alguém é dispensado ou não quer fazer o serviço obrigatório, ele tem que prestar 1 ano de Serviço Civil Obrigatório (Zivildienst). O serviço é remunerado (com uma ajuda de custo) e as pessoas são alocadas para realizarem trabalho em órgãos públicos, escolas, creches, asilos, orfanatos, hospitais, etc. Acho que isto cria uma consciência coletiva maior nos jovens. Além de muitas vezes cobrir defasagens de mão de obra nestes locais.
  • A razão pela qual um diretor de empresa ganha 5, 6 vezes mais do que a recepcionista desta mesma empresa (contra dezenas de vezes no Brasil) é uma só: ambos são bem qualificados e a recepcionista tem um background acadêmico que permitiria a ela realizar praticamente as mesmas tarefas do Diretor. Na Alemanha todo mundo é altamente qualificado e as diferenças salariais se dão apenas por conta de experiência e responsabilidades. Vou ver se escrevo um artigo depois sobre o tema (Educação como redutor de diferenças sociais). Infelizmente, com o envelhecimento da população alemã e a necessidade de trazer imigrantes, a situação está mudando um pouco. Tomara que dêem um jeito de arrumar.
  • Aliás, existe muita necessidade de mão de obra, mesmo especializada. Pessoal da área de saúde e de Tecnologia da Informação que pensa em morar fora por um tempo, ou mesmo se mudar definitivamente de país, deve ficar atento à Alemanha pois eles estão facilitando o Blue Card (o visto de trabalho Europeu).
  • Berlin 2

    Os Berlinenses aproveitando o verão

    Os cidadãos de outros países da União Européia, mesmo com a oportunidade de trabalhar na Alemanha sem necessidade de algum visto especial, tendem a procurar outros lugares, por causa da barreira do idioma (mesmo nos caso das economias em crise, como em Portugal, Espanha, Itália, etc). O pessoal de países como a Polônia, Croácia e República Checa, por ter uma estrutura de idiomas um pouco mais próxima do Alemão é que tem procurado aprender o idioma e migrar para a Alemanha.

  • Apesar de uma grande parte da população alemã ser superqualificada, o sistema educacional alemão sofre bastante críticas. Na Alemanha você tem 3 caminhos a seguir: um técnico (mecanicos, eletricistas, técnicos em geral), um de nível superior (advogados, médicos, engenheiros, etc) e um acadêmico (voltado para pesquisa). O problema é que este caminho é decidido entre a 5ª e 6ª séries (10 e 11 anos) e à partir da 9ª e 10ª (14 e 15 anos) não é mais possível mudar. Se por um lado isto permite que o país faça planejamento de longo prazo, sabendo por exemplo, quantos acadêmicos ele terá em 10 ou 15 anos, por outro, acaba criando carreiras “hereditárias”: os pais mais pobres, que muito provavelmente cursaram o caminho técnico, acabam escolhendo a mesma carreira para seus filhos, pois assim estes filhos estarão no mercado de trabalho mais cedo. Como cada unidade da federação (estados e cidade-estados) são livres para decidir o modelo educacional (a única obrigação nacional é que a criança deve entrar na escola com, no máximo, 6 anos), eles têm uma bucha na mão para resolver.
  • A primeira vez que fui à Berlin, em 2012, para quatro semanas de imersão no idioma, eu fiquei surpreendido com a cidade em todos os sentidos (pessoas, arquitetura, história, lazer, vida noturna, etc). Voltei agora em 2014 para mais três semanas e achei que não iria me surpreender mais. Ledo engano: a cidade me surpreendeu mais ainda do que a primeira vez. E tenho a impressão de que se eu voltar daqui 2 anos, ficarei mais surpreendido ainda.

Dicas:

  • O sistema de transporte público de Berlin foi o melhor que eu vi dos países que visitei. Mesmo sendo antigo e às vezes mal conservado, você consegue chegar a praticamente qualquer ponto da cidade usando trem, ônibus e/ou bonde.
  • Mesmo de e para o aeroport Tegel, que não tem conexão com estações de metrô, é fácil pegar um bus (com espaço para malas) até a Alexanderplatz ou a Hauptbahnhof e de lá seguir de trêm ou metro para qualquer ponto da cidade.
  • Existem opções de tickets diários, para 3 dias, para uma semana e para um mês, com preços por passagens decrescentes.
  • O metrô de Berlin fica aberto 24 horas às sextas, sábados e vésperas de feriados. Engraçado que a maioria das linhas deles têm mais de 100 anos, os trens, em sua maioria são antigos, e eles não precisam de 5 horas diárias de interrupção como o Metro de São Paulo, que é bem mais novo e mais moderno.
  • A DB (Deutsche Bahn), administradora das ferrovias Alemãs tem um ticket especial, para ser usado nos finais de semana, chamado Schönes-Wochenende-Ticket (algo como “ticket de final de semana legal!”). Por um custo de 44 euros, até 5 pessoas podem tomar qualquer trem (exceto os expressos), das 0:00 horas do dia da data do ticket até as 3:00 da manha do dia seguinte. O ticket tem que ser comprado para o Sábado ou para o Domingo. Eu fiz um bate e volta até Dresden num sábado por este valor, que é metade do que custaria um ticket normal de ida e volta, mesmo eu estando sozinho. Crianças de até 15 anos, acompanhados por alguém portador de um ticket destes, também não pagam. Ou seja, dá para uma família inteira (das grandes) ir passar um final de semana em outro ponto do país com 88 euros (um ticket para o sábado e outro para o domingo).
  • Berlin é uma das capitais mais pobres da Europa, apesar de estar num dos países mais ricos. Tudo isto é devido ao período em que a Alemanha ficou dividida e Berlin ficava na parte oriental. Por isto, o custo de vida em Berlin é muito baixo, comparado as outras capitais, como Amsterdam, Londres, Dublin (falando das que eu conheço). Como termos de comparação, usando o “Beer index”: um pint de Heineken em Amsterdam, em um bar, custa 6 euros, enquanto um pint de Berliner Kindl em um bar ou biergarten em Berlin dificilmente passa de 3 euros. O mesmo vale para comida (12 contra 6 euros em um “PF”) e para hotéis (paguei 80 euros na diária em Amsterdam e em Berlin 24).
  • Por conta deste baixo custo, muitos jovens artistas ou emprendedores têm se mudado para Berlin para tocar seus projetos. A cidade é uma efervescência só de artistas e também de start ups.

Bem, acho que destrinchei bastante Berlin nos meus demais textos e os tópicos acima foi o que eu lembrei de não ter comentado antes. Mas se tiver alguma outra pergunta e eu puder responder (afinal, 7 semanas em Berlin não é pouca coisa), é só deixar um comentário que eu vejo se posso ajudar.

Wanderlust #10 – Berlin – Teil 4: atrações

Neste quarto “artigo” sobre Berlin, vou falar um pouco das atrções da cidade. Quais eu achei legal, quais não achei e quais talvez valeriam a pena, dependendo do tempo dispendido na cidade.

No caso de atrações próximas, tentarei colocar num item só para já deixar a dica para o caso de alguém se interessar em fazer um deles, saber que dá pra aproveitar e fazer outros passeios juntos.

Tem que fazer:

  • Museus, museus, museus:
    Berlin é a cidade dos museus! No Spree tem até um banco no meio do rio chamado Museumsinsel (ilha dos museus). É museu da Cerveja, da Salsicha, muitos museus de arte, museu da DDR, das motos da DDR, dos carros da DDR, dos Ramones (sim!). Então com certeza você vai achar algum museu que case com algum interesse bem particular seu. Como disse minha amiga Rebeca: em Berlin só falta o Museu dos Museus. Vou sugerir alguns abaixo que eu gostei.
  • Deutches Historisches Museum:
    a dica que eu sempre dou para toda cidade, a primeira coisa a se fazer é ir ao museu local para tentar entender a história daquela cidade e os eventos que a formaram, bem como o seu povo. Como geralmente a gente chega nas cidades entre 12:00 e 15:00 (eu sempre me programo desta forma, pois uso o tempo entre o checkout de um lugar e o checkin em outro para viajar), dá para conhecer logo de cara. E aproveito também para fazer um reconhecimento à pé do local – Tempo: entre 2 e 4 horas.
  • Karaokê no Mauerpark

    Karaokê no Mauerpark

    Gedenkstätte Berliner Mauer / Mauerpark:
    este museu a ceu aberto na Bernauer Straße, uma das ruas que foram separadas pelo muro, conta toda a história deste episódio da história de Berlin. Contém trechos preservados do muro, da death strip e uma das torres de controle. Com cerca de 2 kms de extensão, termina praticamente no Mauerpark, um outro ponto importante na história do muro. Em dias normais, umas 4 horas para fazer os dois passeios são suficientes, porém, se for no verão e puder ser feito num domingo, aconselho reservar o dia todo: umas 2 ou 3 horas para o Museu e o restante do dia para o mercado de pulgas e o karaokê que acontecem no Mauer Park (isto sem contar os biergartens e artistas de rua do parque).

  • Trabi Safari: uma viagem no tempo

    Trabi Safari: uma viagem no tempo

    Trabi Safari:
    sério, talvez as pessoas achem que eu estou exagerando, mas este foi O MELHOR city tour que eu já fiz na minha vida. Primeiro por dirigir um carrinho que, apesar de espartano, é bem simpático e segundo porque você realmente entra dentro da história. Parece que os pequenos trabis são máquinas do tempo que te levam para a Alemanha Oriental da década de 70. Aconselho fazer o maior percurso, que segue todo o desenho do muro e dura duas horas. Mas reserve umas 3 ou 4, para ouvir as explicações e para perder alguns minutos na loja de souvenirs após o passeio.

  • Potsdamer Platz / Denkmal für die ermordeten Juden Europas / Brandemburger Tor / Tiergarten / Siegessäule:
    o portão de Brandemburgo é provavelmente a atração turística mais famosa da cidade. O que pouca gente sabe é que pode-se emendar algumas outras atrações num passeio só de cerca de duas horas (se não quiser gastar muito tempo, mas se quiser aproveitar o Tiergarten e subir no Siegessäule, reserve umas 4 horas). Comece na Potsdamer Platz e siga placas para o Portão, no caminho você passa pelo memorial aos judeus mortos na Europa. O portão fica em frente ao Tiergarten e, de costas para o portão, você já enxerga a coluna da vitória, a cerca de uns 2 kms. Dá pra chegar até lá passeando por dentro do parque ao invés de seguir uma linha reta.
  • Sim, é um avião de verdade!

    Sim, é um avião de verdade!

    Deutches Teknisches Museum:
    talvez por eu ser fascinado por tecnologia este museu tenha sido um dos mais legais que eu já visitei na vida. Ele tem várias seções contando a história de vários adventos tecnológicos, tais como: trens (deve ter uns 20 trens dentro do museu, então imagina o tamanho), carros, aviões, barcos, fotografia, cinema, cerveja, etc. Precisa reservar ao menos umas 5 horas para poder passear por todas as áreas deste museu gigante sem ter que correr.

  • A imponente Karl-Marx-Alle

    A imponente Karl-Marx-Alle

    Karl-Marx-Alle:
    um monumento à imbecilidade humana erguido como uma prova do poder da URSS e do sistema ali implementado à época. Apesar disto a arquitetura é bela, os prédios simétricos são fascinantes e para quem como eu ainda não conheceu a Rússia, é uma pequena amostra de Moscou. Eu fiz 5 kilometros da avenida em 1 hora e meia, parando para tirar fotos.

  • São Jorge alemão em Nikolaiviertel

    São Jorge alemão em Nikolaiviertel

    Alexanderplatz / Fernsehturm / Nikolaiviertel:
    este é um que dá para emendar com a Karl-Marx-Alle, já que a avenida termina (ou começa) na Alexanderplatz, a praça central de Berlin. Não tem nada demais, mas você não foi a Berlin se não comeu um currywurst acompanhado de uma Schofferhöffer no biergarten desta praça. Aqui também fica a famosa Fernsehturm, cujo topo dá vista para toda a cidade de Berlin (nunca fui, não tive vontade) e dá para emendar andando (uns 15 minutos) Nikolaiviertel, o bairro mais antigo de Berlin. Umas 3 horas dá pra fazer tudo isto, se não tiver muita fila na Fernsehturm. Porém, talvez seja interesante reservar mais tempo, para poder também almoçar e tomar uma cerveja na Geogbräu, uma microcervejaria em Nikolaiviertel.

  • Topologie des Terrors:
    para quem gosta de história este é um local bem interessante. Ele foca, através de fotos, reportagens de jornal, filmes, etc, o período da história alemã entre o final da primeira guerra e a consequente ascensão de Hitler até a queda do muro. Leva umas 2 horas (lendo todo o material) e pode ser feito junto com o Trabi Safari, pois fica do lado.
  • Autostadt:
    esta é para os amantes de carro. A Autostadt (cidade do carro) é um “parque” dedicado à história do carro aberto pela Volkswagen em Wolfsburg, cidade a cerca de 200kms de Berlin. Se estiver por Berlin por mais de 6 dias vale a pena fazer um bate e volta que leva 1 hora de trem para ir, 4 horas passeando pelo parque e mais 1 hora para voltar. Total de 6 horas. E nem perca tempo visitando a cidade de Wolfsburg. É uma cidade industrial como Santo André, Camaçari, Betim, etc. Não tem nada legal para ver.

Dispensáveis:

  • Museus, museus, museus:
    como disse anteriormente entre as coisas boas, Berlin tem museu que não acaba mais. Então mesmo se você for um fã de museus, tente equilibrar seus passeios porque senão corre o risco de perder toda sua estadia na cidade dentro de lugares fechados. Abaixo alguns que eu visitei e desaconselho.
  • Museu de História Natural:
    a não ser que você seja muito fã de biologia, paleontologia, astronomia, geologia e afins, não vale a pena. Se você já visitou o Museu de História Natural de Nova York então, e bem capaz de se decepcionar pois a comparação vai ser inevitável.
  • Museumsinsel:
    5 museus em um lugar só e um daily pass que te permite visitar todos. Não caia nesta. São museus interessantes até, mas são muito específicos (arte barroca, arte egípcia, etc), então, a não ser que você seja fã de algum dos temas ou vá passar bastante tempo na cidade não vale a pena.
  • Museu das Motos da DDR:
    mesmo para quem é fã de moto, este museu não tem nada a mais do que se vê em encontros de carros e motos antigas e nada que chame a atenção. Além de ser pequeno (30 minutos seriam o suficiente)
  • Campos de Concentração:
    em Berlin você fica “sobrecarregado” com histórias da primeira e segunda guerras, do nazismo e da Alemanha dividida (e consequentemente da guerra fria). Não creio ser necessário se deslocar até Sachenhaus (na grande Berlin, o campo de concentração mais perto) só para visitar um campo de concentração. Além do mais, o clima é meio pesado.

 Se tiver tempo:

  • Passeio de barco pelo Spree:
    vale a pena para ver a cidade por outra perspectiva e também é um passeio curto (se for fazer, faça o de uma hora, é mais que suficiente). Se der, aproveite aquela hora pós almoço em que se está cansado de andar e precisa dar uma “jiboiada”.
  • Olimpiastadion:
    muito interessante este estádio, que foi palco das olimpíadas de 32 e da final da copa de 2006, e todo o parque olímpico ao redor. Só cuidado pois além de ficar distante do centro da cidade (uns 40 minutos de metrô) é bem grande, então pode-se perder umas 5 ou 6 horas neste passeio.
  • The Story of Berlin:
    o museu em sí é até meio repetitivo (pedaços do muro, um trabi, etc) mas o final é que é interessante, pois ao final da visita, existe uma visita guiada por um bunker construido na época da guerra fria, que fica uns 4 andares abaixo do solo, no mesmo prédio. Se estiver perdido na Kurfürstendamm e quiser aproveitar é interessante pelo bunker. Na região ficam também o Hard Rock Café de Berlin (para quem gosta de comprar souvenirs da marca, como eu) e a KaDeWe, uma loja de departamentos gigantes (também legal para comprar souvenirs).
  • Tempelhof:
    a história desde aeroporto desativado que virou parque vale mais do que o parque em sí. Mas se estiver tentando manter a rotina de exercícios durantes as férias, dá pra ir até lá correr (em uma das duas pistas de pouso) ou dar umas pedaladas.
  • East Side Gallery:
    bem legal para quem curte grafitti. E só!
  • DDR Museum:
    este é outro passeio curto que vale para a “jiboiada” pós almoço (fica bem na região central, perto da Museuminsel, Berliner Dom, etc). O museu é pequeno (cerca de 1 hora de visitação) e mostra como era a vida na DDR.

Noite:

Eu sou um cara mais do dia. Gosto de aproveitar mais enquanto tem luz do sol, de dormir pouco e levantar cedo, mas aqui vão algumas dicas para atrações noturnas na cidade (as poucas que eu visitei em 7 semanas!). Até porque não se pode perder oportunidades em uma cidade onde o transporte público funciona 24 horas aos finais de semana e véspera de feriados (só fique esperto com os horários pois os intervalos são bem maiores)

  • Prenzlauer Berg:
    este distrito próximo ao Mauerpark é repleto de bares, restaurantes e discotecas. Sugiro o Zu Mir Oder Zu Dir (um bar com DJ rolando louge e eletrônicos mais softs, é pra sentar e conversar tomando uma cerveja. Só avisando pra quem se incomoda: no local é permitido fumar, mesmo sendo fechado) e a Kultur Brauerei, uma antiga fábrica de cerveja transformada num centro com restaurantes, bares, galerias de arte, etc.
  • Cuvrystraße:
    um dos vários bairros boêmios de Berlin. A Lido é uma danceteria legal (especialmente se tiver rolando noite de Soul music) e vale a pena dar uma passada antes na comunidade Hippie que existe na esquina com a Schlesische Straße.
  • Mitte:
    tanto na Torstraße quanto a Oranienburger Straße existem vários restaurantes e bares, de tudo quanto é tipo (muitos italianos, mexicanos, indianos, pubs, etc)
  • Competição entre mesas no The Pub

    Competição entre mesas no The Pub

    Alexanderplatz:
    existem alguns barzinhos e restaurantes nas redondezas da praça. Seguindo a linha do trem, sentido Hackescher Markt, existem dois lugares interessantes para apreciadores de cerveja. O primeiro é o BHM Brauhaus Mitte, uma cervejaria local e o segundo é o The Pub, onde existem mesas que vendem cerveja a litro, baseado num “cervejômetro” instalado nas mesas e que permite a separação da conta em até 8 “comandas” diferentes. So tome cuidado pois eles colocam quanto cada mesa consumiu no telão e isto acaba gerando uma competição que pode acabar numa bela ressaca….hahaha

  • Hackescher Markt:
    existem alguns bares, pubs e restaurantes instalados na parte de baixo da estação. Alguns deles funcionam 24 horas.
  • James-Simon-Park: uma das "praias" dos Berlinenses

    James-Simon-Park: uma das “praias” dos Berlinenses

    James-Simon-Park e Monbijou Park:
    os dois parques ficam à beira do Spree e são separados apenas por um túnel. No James-Simon existem vários barzinhos com cadeiras de praia, mas no verão o pessoal pega cerveja e fica na grama mesmo. No Monbijou existe o Strandbar, bem colado ao rio, também com cadeiras de praia e mesas. No Strandbar, quando o clima permite, acontecem aulas de dança (tango, ritmos caribenhos e africanos) no final da tarde / começo da noite.

Bem, é isto. No próximo artigo falarei um pouco sobre impressões que eu tive da cidade e do povo e também darei algumas dicas para os viajantes.

Be happy!!!! 🙂

Wanderlust #9 – Berlin – Teil 3: die Stadt

Os prédios com espaços no meio, que geralmente são jardins de inverno

Os prédios com espaços no meio, que geralmente são jardins de inverno

Conforme já comentado no artigo anterior, sobre a história da cidade, Berlin nasceu à margem do Rio Spree e acabou crescendo as margens deste rio. Perto do Spree é onde se encontram os bairros mais antigos da cidade, seus mais famosos museus, praças e edifícios.

O Spree hoje é inclusive uma rota turística da cidade, por onde se pode fazer excursões que passam praticamente pela maioria dos principais pontos turísticos.

Porém, com todos os acontecimentos que marcaram a história de Berlin, especialmente as guerras e a divisão da cidade durante a guerra fria, não é difícil imaginar que a cidade apresente uma variedade impressionante no que se refere à arquitetura.

Hauptbahnhof: uma maravilha da engenharia moderna

Hauptbahnhof: uma maravilha da engenharia moderna

Apesar de muitos dos edifícios que foram destruidos durante a segunda guerra terem sido reconstruidos, especialmente na parte oriental (os soviéticos eram bons nisto, na Polônia e em Dresden também existem vários edifícios que foram restaurados exatamente como eram antes dos bombardeios), existe muita modernidade convivendo com certa harmonia com construções antigas. Um exemplo é a Potzdamer Platz. A estação central de trem (Hauptbahnhof = estação de trem principal) é uma verdadeira maravilha da Engenharia e Arquitetura, tendo sido inclusive tema de um programa na Discovery (ou NatGeo, não lembro qual).

Na parte ocidental é onde se encontram os prédios mais modernos, porém, atualmente a parte oriental parece um canteiro de obras, pois apesar de os soviéticos terem reconstruído vários dos edifícios, e até terem construído uma réplica de Moscou na Karl-Marx-Alle, uma imponente avenida com quase 20 metros de largura e prédios simétricos (eles precisavam de um lugar para os desfiles militares), eles focavam esforços no que iria ficar visível para as câmeras de TV e fotografia. Ou seja, nas avenidas principais os prédios foram reconstruidos, ou foram construidas novas e imponentes edificações, porem, atrás destes a cidade era praticamente abandonada, então hoje em dia existem diversos prédios e galpões em estado precário e que estão (infelizmente) sendo demolidos para darem lugar a prédios comerciais e residenciais modernos.

Berlin Karl-Max-Alle

Karl-Max-Alle: uma avenida imponente com edifícios simétricos

Os terrenos que compunham a death strip também estão sendo, aos poucos, alvo da especulação imobiliária. Isto quase gerou um problema: a região à margem do Spree onde se encontra a East Side Gallery, a maior seção do muro ainda de pé e que se transformou em uma galeria de arte a céu aberto, foi adquirida por uma empresa que está erguendo ali um condomínio comercial. Inicialmente o plano era acabar com a East Side Gallery, porém após protestos da população, eles resolveram conservar o muro. Mas a imagem de um prédio comercial entre a East Side e o Spree não é das melhores.

Um outro resquício da guerra fria é a Fernsehturm (simplesmente “Torre de TV”): os soviéticos a construiram como um ato de provocação, para que ela fosse vista de qualquer ponto da cidade, especialmente pelos ocidentais, e conseguiram seu objetivo. Apesar de hoje em dia alguns prédios mais altos já encobrirem a visão da torre, ela é tão grande que se tornou até um ponto de referência: basta você procurá-la para saber em que direção está o centro da cidade. É possivel inclusive enxergá-la por vários minutos enquanto o avião está pousando em um dos aeroportos da cidade. Mas não pense que só os soviéticos eram filhas da puta: os americanos construiam perto dos checkpoints, os pontos por onde era possível passar de um setor à outro e onde os orientais conseguiam enxergar a parte ocidental (a death strip servia também para que o pessoal do leste não tivesse contato nenhum com o do oeste), restaurantes para que o pessoal do oriente soubesse que não havia falta de comida no ocidente.

O moderno convivendo com o antigo na margem do Spree

O moderno convivendo com o antigo na margem do Spree

Os prédios, mesmo os mais novos, têm uma característica diferente do que temos no Brasil. Aqui geralmente a posição do prédio em relação ao terreno visa aproveitar o máximo da luz do dia para as áreas de lazer e para permitir que, ao menos em parte do dia, os apartamentos sejam iluminados pela luz do sol. Em Berlin, geralmente os prédios são construídos “em volta” dos terrenos, tendo um centro aberto (que geralmente são jardins de inverno) e desta forma as “áreas de lazer” e os cômodos principais (geralmente quartos) ficam isolados do vento pela parte externa do prédio. Da mesma forma, as ruas não são retas enormes, mas sim um ziguezague (se olhado do alto), pois isto impede que o vento corra por entre os prédios.

Outra coisa interessante da cidade é que ela é praticamente plana (por isto a Fernsehturm é vista praticamente de qualquer ponto), apresentando poucos morros (Berg em alemão). Esta característica faz com que a cidade seja perfeita para o uso de bicicleta como transporte no dia a dia. Estima-se que existam 2,5 milhões de bicicletas na região metropolitana de Berlin, para uma população de aproximadamente 5 milhões de pessoas.

No fundo, ao centro, a Fernsehturm, que pode ser vista de praticamente toda Berlin

No fundo, ao centro, a Fernsehturm, que pode ser vista de praticamente toda Berlin

Mas uma das coisas que mais me impressiona em Berlin é o seu sistema de transporte público. Exceto se você morar em algum subúrbio muito distante, você praticamente não precisa de carro para se locomover na cidade. Sua rede interligada de trêns urbanos (U-Bahn), suburbanos (S-Bahn), ônibus e bondes (tram) faz com que você consiga chegar em qualquer ponto da cidade sem maiores dificuldades. E para melhorar, as sextas, sábados e vésperas de feriados o metrô funciona 24 horas.

Não sou um profundo conhecedor ou admirador de arquitetura, apesar de me interessar um pouco por urbanismo, mas creio que Berlin deva ser uma das cidades que têm o maior acervo do mundo, quando se fala em estilos arquitetônicos. E mesmo quem, como eu, não tem muito interesse pelo assunto, começa a prestar atenção em detalhes que em outros lugares passariam despercebidos e a andar olhando para o alto, para encontrar alguma surpresa no alto dos prédios ou no topo das igrejas, bibliotecas e museus.

Wanderlust #8 – Berlin – Teil 2: die Geschichte

Brandemburger Tor

Brandemburger Tor (Portão de Brandemburgo) e sua famosa quádriga.

Uma das coisas que mais me atraem nos lugares que visito é a história daquele local. Através da história se explica a arquitetura, o comportamento do povo, os pontos turísticos e históricos e te dá um panorama geral do porque daquele local ser daquele jeito e atrair turistas. Para continuar contando um pouco de Berlin, acho que se faz necessário contar um pouco da história da cidade, especialmente porque alguns fatos são bem recentes (eu vi no Jornal Nacional as cenas das pessoas quebrando o muro e via notícias sobre tensões da guerra fria). Então, neste segundo post sobre Berlin, um pouco dos fatos que moldaram esta cidade fantástica:

Alguns séculos antes de Cristo, a região à beira do rio Spree já era habitada por algumas tribos, porém o primeiro documento em que o nome Berlin é mencionado, então como um povoado, é de 1237. Mais tarde, em 1307, ao se juntar com outro povoado (Cölln), também às margens do Spree (onde hoje se localiza o Nikolaiviertel), se torna definitivamente um município.

Em 1486 torna-se sede do território que atualmente constitui o estado alemão de Brandemburgo. Com a subida de Friedrich Whilhem ao trono de Brandemburgo, em 1640, a cidade desenvolveu-se rapidamente. No início do século XVIII, o sucessor de Friedrich Whilhelm, Friedrich III, transforma Brandemburgo num reino e é coroado como Friedrich I da Prússia e Berlin torna-se a capital do reino da Prússia.

No começo do século XIX, Napoleão derrota a Prússia e ocupa Berlin, levando para Paris a quádriga (biga é um carro utilizado em esportes e combates que é conduzido por 2 cavalos, quádriga é um com 4) que decorava o já existente Portão de Brandemburgo, até hoje uma das atrações mais conhecidas da cidade. Com a queda de Napoleão, a quádriga voltaria para Berlin e seria recolocada sobre o portão.

Ainda na primeira metade do século XIX, começa o processo de industrialização de Berlin, o que acelera o desenvolvimento da cidade.

Na segunda metade do século XIX, Otto von Bismarck, através de guerras contra a Dinarmarca, Áustria e França, consegue unificar os povos de língua alemã sob o Império Alemão, no que é conhecido como o segundo Reich. Berlin se torna então a capital do Império Alemão e recebe diversos projetos de infraestrutura urbana.

No começo do século XX a cidade já tinha quase 2 milhões de habitantes. A primeira guerra mundial, que culminou com a derrocada do Império Alemão, não chegou a impactar consideravelmente a cidade, que continuava a ser capital da Alemanha e seu centro cultural, intelectual e político. Com a nomeação de Hitler ao posto de chanceler, em 1933, a história da cidade começaria a mudar radicalmente.

Primeiramente Hitler pretendia demolir e reconstruir Berlin e, à partir do início da segunda guerra, Berlin sofreria diversas mudanças que a transformaram no que ela é hoje. Primeiramente foram os seguidos bombardeios sobre a cidade que ocorreram por praticamente 5 anos e destruiram a maioria dos edifícios, e depois foi o processo de ocupação pelos vencedores do conflito.

Berlin WallEine geteilte Stadt
Com o fim da segunda guerra e a derrota da Alemanha os quatro países vencedores do conflito (Inglaterra, França, Estados Unidos e União Soviética) resolvem dividir o país em quatro regiões, a serem controladas, temporariamente, por cada um dos vencedores. Berlin ficaria dentro da parte sob controle da URSS, porém, como a cidade era um centro cultural e intelectual, os quatro países negociam na cidade de Potsdam (uma cidade na região metropolitana de Berlin, capital do estado de Brandemburgo, falarei desta bela cidade mais pra frente) que Berlin também seria dividida em quatro setores, cada um sob administração de um dos países.

Aqui vem o primeiro engano de muita gente (inclusive meu): o muro de Berlin, que seria construido mais tarde, na verdade não “dividia” a Alemanha, ou mesmo Berlin, entre duas partes, mas sim cercava a área que estava sob controle dos aliados do oeste, já que a cidade inteira ficava dentro da região sob controle soviético. Ou seja, era uma prisão onde as pessoas queria entrar.

Afim de disseminar sua ideologia e evitar a disseminação da ideologia dos países do oeste, os soviéticos começam a bloquear as fronteiras terrestres, as linhas de trem e até a controlar o acesso fluvial, tanto para cidadãos que sairiam da parte sob seu controle, quanto para os que desejavam entrar. Em 24 junho de 1948, este bloqueio é extendido também para as cargas que chegariam à parte ocidental de Berlin, com a intenção de que os aliados do oeste abandonassem os seus setores, permitindo assim o controle soviético em toda a cidade. Porém, os aliados do oeste montam uma das maiores operações aéreas da história (os acessos terrestres, fluviais e ferroviários estavam bloqueados, porém, existia um corredor aéreo previamente negociado) para abastecer a parte ocidental de Berlin com os insumos necessários. O Berlin Airlift, como ficou conhecido, teve como base o aeroporto de Tempelhof (que até a unificação se transformou também em base aérea americana) e durou até 11 de maio de 1949.

Berlin Wall FallComo as fronteiras com o ocidente estavam fechadas, os residentes da alemanha oriental se dirigiam até Berlin, afim de tomar aviões para outras partes do país e assim fugir da área de controle soviético. E ai começa uma das histórias mais emblemáticas do século passado.

Berliner Mauer
Para impedir a fuga dos alemães orientais para o ocidente (a esta altura, a República Democrática Alemã já havia sido fundada pelos soviéticos), os soviéticos começam a bloquear, começando por pontes que davam acesso aos setores ocidentais (trechos dos rios que cortam Berlin já haviam se tornado “fronteiras” naturais) e estações de metrô e trem (várias estações ficaram desativadas, pois ficavam na ou muito próximo à divisa, elas ficaram conhecidas como “estações fantasmas” – Geisterbahnhöfe), os acessos à Berlin ocidental.

Porém, muitas ruas, parques e terrenos ficavam entre os dois setores e, somente as patrulhas não conseguiam conter as fugas. Em 1961 dá-se o início da construção do muro. Inicialmente alguns trechos foram construidos em ruas ou parques, ou mesmo nas margens dos rios, para evitar a passagem. Muitos prédios tiveram os acessos ao lado ocidental bloqueados, porém, os moradores continuavam a pular as janelas para acessar os setores americano, francês e inglês da cidade.

A Bernauer Straße foi uma das ruas mais utilizadas como rota de fuga, já que as janelas davam exatamente para o lado ocidental. Em determinado momento, os moradores dos apartamentos de frente para o lado ocidental são deslocados para outros apartamentos e as janelas são fechadas com tijolos.

Alguns anos mais tarde, afim de reforçar a segurança, alguns prédios (a maioria dos prédios da Bernauer Straße, por exemplo) seriam demolidos para dar lugar ao muro (a segunda versão, a primeira, construida em 1961 era mais rústica e a segunda, construída ao longo dos anos, é a mais conhecida e feita de blocos pré fabricados) e para compor o que ficou conhecido como a “faixa da morte” (death strip): uma área de segurança próxima ao muro, onde existiam barreiras (geralmente arame farpado), as torres de observação e onde os veículos de patrulha circulavam.

Até a queda do muro, em novembro de 1989, oficialmente morreram 138 pessoas (alemães orientais tentando escapar, alemães ocidentais que estavam próximos ao muro e foram mortos por “acidente” e oficiais que foram mortos por tentarem desertar ou por acidente), porém, como as informações do lado oriental não eram confiáveis e muitas vezes eram manipuladas, imagina-se que este número tenha sido maior.

Além disto, sabe-se que a criação do muro e a restrição de circulação, quando não a separação de famílias e amigos, foi causador de muitos casos de stress e depressão que, provavelmente, podem ter causado a morte de mais pessoas, dos dois lados do muro.

Berlin Wall Fall2Na noite de 9 de Novembro de 1989, já com a URSS à beira do colapso e a guerra fria quase no fim, os cidadãos berlinenses, após a declaração de um oficial do governo da DDR (Günter Schabowski), que se enrolou com as palavras e, ao invés de dizer que a fronteira seria aberta “em pouco tempo” (sobald), disse “imediatamente” (sofort), dezenas de milhares de cidadãos se dirigiram para os postos de controle afim de deixar o quanto antes a parte oriental de Berlin (aliás, cidadãos de outras cidades da DDR também se dirigiram para lá, mesmo sendo tarde da noite), os guardas da fronteira, diante de tanta gente, preferiram recuar, o que possibilitou que muita gente, por conta própria, começasse ali a demolição do muro, criando assim vários “pontos de cruzamento de fronteira” não oficiais.

Em 3 de Outubro de 1990, a Alemanha foi oficialmente reunificada e Berlin recebeu novamente o status de Capital da Alemanha.

Wanderlust #7 – Berlin, teil 1: Die Leute

0901 Berlin - Mauerpark

Karaokê no Mauer Park: o berlinense gosta de atividades coletivas

Ufa! Até que enfim! Esta era para ser a primeira cidade a ser tema da “coluna” Wanderlust do Botecoterapia, mas o negócio começou a ficar interminável e como eu já estava prestes à voltar para cá (escrevo este texto “in loco”), resolvi “soltar” os textos dos EUA (que também foram escritos “in loco”) e o de Parati enquanto estavam “frescos” na memória. O momento é até mais legal, pois pelo fato de terem poucos brasileiros na escola (não conheci nenhum, pois não tem nenhum na minha sala), acabei fazendo mais programas sozinhos e, para ajudar, é mês de copa, e pelo que tenho percebido, os alemães adoram assistir os jogos coletivamente, principalmente no que eles chamam de “WM Public View” (WM é a abreviação de Weltmeister, campeonato mundial).

À exemplo do texto dos EUA, em que quebrei em várias partes, para não ficar algo longo e chato, farei o mesmo com os textos de Berlin. Estou prevendo inicialmente 6 textos, abordando diversos aspectos da cidade, sua gente e suas atrações, porém como estou aqui e as experiências ainda estão sendo vivenciadas, este número pode mudar e, eventualmente, posso até voltar num assunto já tratado. Para iniciar, falarei um pouco sobre os berlinenses.

Os Alemães, por conta de todos os acontecimentos do século passado dos quais eles foram causadores e/ou protagonistas (duas guerras mundiais, guerra fria, muro de Berlin, Holocausto, etc) carregam em si uma culpa enorme.

Além dos vários monumentos em toda a parte para homenagear as vitimas e relembrar estes terríveis acontecimentos (“nós não podemos nos esquecer para que não aconteça novamente”, é a justificativa para tantos monumentos), a Alemanha tem sido um dos principais países à contribuir com causas sociais e humanitárias, com recuperação econômica de outros países e, mesmo com uma recente crise em países da zona do Euro, por culpa única e exclusiva destes, não abandonou o barco para não deixá-los à deriva (fato que poderia desencadear em uma crise bem pior, caso ocorresse). Talvez isto seja uma forma de autopunição na tentativa de expiar os pecados de um passado recente.

Verão é a época de atividades ao ar livre em Berlin

Verão é a época de atividades ao ar livre em Berlin

O Berlinense, por sua vez, já passou por esta fase. Eles tiveram a cidade dividida como um espólio da guerra e viveram uma divisão física e todas as tensões de ser a fronteira entre os contendores da guerra fria. Portanto, seus pecados aparentemente já foram pagos e com isto eles evoluiuram e o Berlinense é acima de tudo tolerante. Ele tem tolerância de gênero, de orientação sexual, de credo, de etnia e tudo quanto é tipo. Em Berlin, a frase “quer aparecer pendure uma melância no pescoço” é totalmente ineficaz, pois por mais que alguém não ache legal ou não goste de alguém com uma melância no pescoço, ele tende, genuinamente, a aceitar e respeitar.

Então ao andar de metrô por aqui você vê gente de todas as etnias, credos, culturas, etc. Os muçulmanos podem usar seus turbantes e barbas sem problemas, vejo todo dia mulheres de burka, você encontra uma senhora sexagenária com o cabelo moicano pintado de rosa, piercing e tatuagens por todo o corpo conversando com moleques de 15 anos vestidos com o melhor da moda nerd, casais homossexuais passeiam sossegadamente de mãos dadas, etc. Existe uma tolerância muito grande também aos imigrantes, sejam eles legais ou ilegais.

Dos países da zona do Euro, a Alemanha talvez seja o que mais consegue lidar com estas ondas migratórias e Berlin, em especial, é uma cidade que recebe e tenta, de algum modo, propiciar oportunidades para estas pessoas.

Além da tolerância, uma outra característica que é inerente aos berlinenses (muito provavelmente pelos mesmos motivos) é aproveitar a vida da melhor forma possível. E para eles, aproveitar a vida não é uma questão de grana, de posses. Eles querem apenas se divertir, tomar sua cerveja, assistir seu futebol, aproveitar os poucos meses de tempo bom ao ar livre, seja fazendo churrasco nos parques, seja apenas sentando na beira de um rio para aproveitar o clima ameno.

O povo é festeiro!

O povo é festeiro!

Estando desta vez sozinho “mesmo”, tenho tido a oportunidade de conversar bastante com alemães, especialmente nas exibições dos jogos da Copa. Uma coisa bem legal que existe por toda a Alemanha e que propiciam uma oportunidade maior de contato são as mesas coletivas em bares, Biergartens, restaurantes, etc. Toda vez que estou numa destas mesas, a pessoa que está do lado puxa conversa, se apresenta e, na medida em que meu alemão permite (quando esta pessoa não fala inglês) acontece uma conversa bastante amistosa, com os alemães muito interessados em saber onde eu moro no Brasil, o que eu faço, o que as pessoas fazem, como é o clima, as ruas, as pessoas.

Aqui um adendo interessante: já é a minha terceira vez na Europa e já fui uma dez vezes aos EUA. Os alemães, ao saberem que sou do Brasil, é o um dos poucos povos (o pessoal do leste europeu também age como eles) que não fala da “mulher brasileira” (no melhor estilo chauvinista, especialmente americanos e ingleses) ou de futebol (especialmente italianos e espanhóis). Ele parece se interessar genuinamente por uma cultura diferente da deles.

Mesmo no metrô ou na rua, se vc está com alguma camiseta engraçada, ou se acontece algo engraçado (como o exemplo do rapaz que foi tirar uma foto e virou o copo de cerveja que estava segurando nele mesmo), eles fazem piadas, dão risada e todo mundo leva na esportiva.

Dizem que os brasileiros são um povo que ri das próprias desgraças. Eu acho que o Berlinense é o povo que, apesar de ter sofrido e causado várias desgraças, aprendeu a rir da vida e sem a necessidade de se fazer de coitadinho, como os brasileiros.

Quer dizer, eles até se fazem um pouco de coitados, pois foram eles que, infelizmente, ficaram sob o controle da antiga URSS e, enquanto o restante do país, que estava sob o controle de EUA, França ou Inglaterra, se desenvolveu absurdamente em menos de meio século, Berlin ficou parada no tempo (inclusive o setor ocidental). Mas acho que este “coitadismo” deles, tem mais a ver com dar uma de pobre (em comparação com o restante da Alemanha, especialmente a região da Bavária, e outros países europeus, Berlin é sim pobre) e pagar menos na cerveja……hehehe.

Afinal de contas, como diz o lema: Bier ist billiger als Wasser, das ist Berlin!

Tá certo que o pragmatismo e o “metodismo” alemão várias vezes são irritantes (e olha que eu sou um cara metódico pra caramba!). A inflexibilidade deles também é algo que é complicado de lidar, ainda mais para nós, por conta do nossa “maleabilidade” (o famoso “jeitinho brasileiro”), mas mesmo assim, de todos os povos que eu conheci, por incrível que pareça, eles são um dos mais amistosos.

Berlin Tempelhof: uma aula de ocupação dos espaços públicos

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Já havia falado no meu texto sobre a Virada Cultural (aqui) que eu acho muito legal os movimentos que ocupam os espaços públicos nas cidades, especialmente nas grandes, onde a “luta” pelos espaços é intensa.

Infelizmente os espaços ficam cada dia mais escassos e existem vários atores que lutam para ocupar estes espaços, entre os principais, destacam-se a própria população, as empresas do ramo imobiliário e, de certa forma até o crime organizado. Quem já jogou War sabe que, quando um jogador conquista um território, se ele se estabelecer ali, fica praticamente impossível retomar aquele espaço. O mesmo acontece com os espaços urbanos nas grandes cidades (a região da cracolândia, em São Paulo, é um grande exemplo).

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Pistas de pouso e taxiamento transformadas em pistas de cooper e ciclovias

Por isto acho que quanto mais a população ocupar estes espaços, estabelecendo aquilo como de uso público, mais as outras “forças” têm que recuar e ceder aquele espaço. Da mesma forma, se a população recua e se contenta em ficar restrita à sua casa, seu condomínio ou a espaços privados de terceiros (shoppings, cinemas, etc), a chance de retomar aquilo que deveria ser usado para um bem coletivo diminui.

Nesta minha segunda viagem à Alemanha tive a oportunidade de conhecer o Tempelhof, um aeroporto desativado que tem se transformado, nos últimos anos, em um parque. A minha curiosidade em conhecer o Tempelhof era justamente por ser um aeroporto, mas ao entender como ele está sendo construido, minha motivação para percorrê-lo praticamente todo era entender um pouco mais deste processo.

A história do Tempelhof
O aeroporto de Tempelhof, que já era usado como pista de lançamento desde o início do século 20, foi declarado oficialmente um aeroporto em 8 de Outubro de 1923. Foi o aeroporto onde a Lufthansa, a maior empresa aérea alemã e uma das maiores do mundo, foi fundada em 1926.

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Jardim comunitário: os moradores do entorno do parque cultivam ali seus jardins

O terminal de passageiros, bem como seus hangares, foram durante muito tempo considerados os maiores do mundo. Foi também o primeiro terminal de passageiros do mundo a ter uma ligação direta com uma estação de trem ou metrô. Por sua imponência e tamanho, ele era um dos símbolos da força e poder do povo alemão durante o regime nacional socialista de Hitler, tendo este inclusive utilizado o aeroporto para um de seus mais célebres discursos, em maio de 1933, que segundo estimativas, foi presenciado por cerca de meio milhão de pessoas.

Durante a guerra fria, com os acessos terrestres e fluviais bloqueados pela URSS, o aeroporto foi muito importante para abastecer o setor ocidental de Berlin de comida, combustível e outros insumos e, durante este tempo serviu, além de aeroporto, como uma base aérea americana.

Após a queda do muro e a unificação da Alemanha, houve uma decisão política de se manter apenas um aeroporto na cidade e o escolhido foi o Schönefeld. Mais tarde houve a decisão de manter um segundo aeroporto, sendo este o Tegel (que originalmente também seria fechado). O aeroporto de Tempelhof foi ocifialmente fechado em 30 de Outubro de 2008, porém 3 aeronaves não puderam decolar naquele dia devido ao mau tempo e só deixaram o aeroporto em 24 de Novembro de 2008, quando então o aeroporto deixou de operar definitivamente.

O Tempelhof era tão grande, levando-se em consideração a época que ele foi construído, que chegou a abrigar uma feira aeronáutica em 1976, que teve inclusive o pouso e decolagem de um 747 da Pan Am, então a maior aeronave comercial em operação.

A ocupação
Com o aeroporto fechado e todo aquele terreno à disposição, a população vizinha ao aeroporto começou a utilizá-lo eventualmente para algumas atividades de lazer. Apesar de terem existido algumas atividades oficiais, como corridas nas pistas e feiras nos hangares, foram as atividades espontâneas que talvez mudaram o futuro do espaço.

Primeiro algumas pessoas começaram a “invadir” aos finais de semana para andarem de bicicleta, de skate ou apenas para correr nas pistas. Nas áreas próximas às entradas, e longe das pistas de asfalto, algumas pessoas aproveitavam a grama para jogarem futebol ou vôlei. Depois as pessoas começaram a fazer churrascos dentro do local, ou a levarem seus cachorros para um passeio sem coleira.

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Curso de minigolf montado pela própria população, com restos de aviões ali encontrados.

Em Agosto de 2009 a prefeitura de Berlin anunciou oficialmente que iria transformar o local em um parque. Porém, diferentemente do que normalmente vemos acontecer, onde o aparelho público chega e define que tipo de atividades existirão no local (por exemplo: terá um campo de futebol, duas quadras de tenis, tantas mesas para piqueniques, etc), como o local já estava sendo usado pela população, o tipo de atividade que está sendo desenvolvida no parque está sendo criada pelos próprios frequentadores conforme a utilização do espaço (a prefeitura só bloqueou acesso a algumas áreas que funcionam como santuário de pássaros).

Atualmente existem duas grandes áreas destinadas à churrasco, um grande campo de futebol, três quadras poliesportivas menores, três “dog parks” onde os donos podem soltar seus cachorros (cada um deles é destinado a determinado porte de cachorro), entre outros equipamentos. Os moradores vizinhos construíram também um “campo” de minigolf, utilizando-se de peças de aviões que estavam abandonadas no local.

Além disto, os moradores mantêm outros projetos dentro do agora parque, como um jardim comunitário, onde estas pessoas vão desenvolver atividades de jardinagem, que na maioria das vezes constitui-se no hobby delas, mas que por falta de espaço nos edifícios onde elas vivem, não seria possível desenvolver.

Assim como aconteceu com a East Side Gallery, que iria ser demolida para dar lugar a prédios comerciais (os prédios estão sendo construídos, mas a galeria foi mantida, mesmo assim a visão de um prédio comercial na beira do Spree, atrás de pedaços do muro de Berlin, não é legal) e a população interviu para que isto não ocorresse, no Tempelhof ocorre algo parecido, com uma intervenção ainda maior da população, seja brigando junto aos órgão para que eles equipem o parque com os aparelhos necessários, seja eles mesmo se unindo e contruindo estes aparelhos.

Ainda bem que eles tomaram a iniciativa pois, se não houvessem tomado, talvez teriamos neste momento um canteiro de obras construindo prédios residenciais, comerciais, ou pior ainda, um shopping naquele local. Parabéns aos berlinenses!!!