Este foi o segundo livro do Parral que eu adquiri (leia a resenha do anterior aqui). Diferentemente do primeiro, que tem como ponto central a política, este segundo passa por vários assuntos, desde cultura, religião e claro, política também.
O livro, que conta com um prefácio de “Deus”, transcrito pelo Antonio Abujamra, parte de duas premissas interessantes. A primeira delas é usar um romance para tratar de questões filosóficas, bem ao estilo Nietzche, Camus, Dostoievsky, entre outros autores que ao longo da história usaram deste recurso. Eu acho bem interessante, pois quando se fala diretamente em filosofia, o livro tende a ficar um tanto quanto maçante (tente ler Sócrates ou Platão, por exemplo) e em forma de romance, as idéias do autor são colocadas dentro de um contexto e ilustradas, o que facilita a leitura e o entendimento. Além de atingir pessoas que normalmente não se interessariam pelo tema.
“A capacidade natural de gerar a vida no próprio corpo e incapacidade inata de enfrentar os conflitos pela força são diferenciais fundamentais. Quem gera, pare, amamenta, educa e forma tem mais condição de gerir que quem, invariavelmente, abandona, massacra e mata…”
A segunda, é o mote principal da estória, de que Cristo, na sua segunda vinda à terra, viria na forma de uma mulher, pois somente o amor da mulher seria capaz de salvar a humanidade.
À partir desta premissa, a história toda é desenvolvida e o autor envereda por diversos assuntos, ligados diretamente ou não à este tema central, como por exemplo, o papel da mulher na nossa sociedade (machista), o porque das religiões ocidentais sempre ligarem a figura de um ser superior e/ou salvador a um homem, etc.
Mais pelo meio do livro, com a história já encaminhada, as questões filosóficas se desenrolam para o momento cultural da nossa sociedade e passa a fazer uma análise de cenários da política (e poder) mundiais.
“Uma das grandes deficiências do capitalismo é a falta de uma política social, ecológica e cultural mais sensível, voltada para a melhor distribuição dos resultados e o cuidado com seus custos ambientais.
Como sistema eficiente de produção é o que de melhor a história já produziu. Porém, como métodologia distributiva praticamente não avançou.”
O autor também trata de temas polêmicos e tabus, como poligamia, homossexualismo, aborto, entre outros tantos “vespeiros” em que outros autores geralmente só se arriscam a botar a mão em estórias totalmente fantasiosas.
“A bestialidade do mundo se alimenta da própria podridão. A aberração de que nos acusam geralmente está em que nos aponta e tenta rotular, não em quem é apontado. Normalmente nos convertem em espelho onde se fazem refletir e, por não se admitirem como se vêm nos acusam da própria bestialidade ou hediondez.”
Eu gostei de como os temas são introduzidos no texto, apesar de não ter gostado do romance em sí. Talvez por ter muito misticismo isto acabe fazendo com que eu crie uma certa antipatia inicial, mas gosto muito de como o Parral desenvolve suas idéias (quer concordando com elas ou não) e de como ele aborda os temas com uma imparcialidade rara no meio literário nacional, já que a maioria dos autores insistem em incutir suas ideologias de uma forma “passional”, mesmo pregando e apresentando-se como imparciais.