Confesso que nunca tinha lido João Guimarães Rosa na vida. Pelo menos não que eu me lembre. E olha que durante a adolescência eu era um leitor voraz, praticamente um rato de biblioteca. Mas sei lá por que, nunca um livro do autor cruzou meu caminho.
E também não sei por que cargas d’água eu encasquei que iria ler Sagarana há pouco mais de um ano atrás. Talvez alguém compartilhou no Facebook e acabou grudando no meu subconsciente. Então na última vez que estive no Brasil o livro já estava na minha lista. Mas não consegui encontrá-lo disponível no Submarino (ao menos não num tempo de entrega que me atendesse).
Neste interim fui arrumar umas tralhas minhas e dar fim em algumas coisas que ainda estão na casa da minha mãe e, dentre alguns outros livros que haviam no “quartinho da bagunça”, achei Sagarana. Uma edição de 1984, meio surrada até (inclusive com partes de algumas poucas páginas faltando). Parece que ele estava há um tempão me esperando!
O livro, o primeiro publicado por Guimarães Rosa, é uma coleção de contos, alguns com um certo ar de fábula. Todos eles retratando a vida, o cotidiano e os causos do povo do sertão, especificamente do sertão de Minas Gerais das primeiras décadas do século passado. As vezes dá a impressão de que são aqueles causos que são contados há diversas gerações, que ninguém sabe se ocorreram ou não e que vão se adaptando conforme são passados adiante.
Mesmo se for este o caso, Guimarães Rosa teve maestria em colocá-los no papel. Mais do que isto, em conduzir as narrativas de uma forma muito bonita e até terna, mesmo naqueles contos em que a estória era triste ou “pesada”. Me lembrou os poucos contos de Gorki que eu li.
Um outro ponto que chama a atenção no livro é a riqueza de detalhes em descrever o ambiente. É impressionante o conhecimento da fauna e da flora que Guimarães Rosa parecia ter. Foi tanto nome popular pra planta e bicho que até me perdia de vez em quando. Uma das diversões enquanto lia o livro era tentar imaginar como deve parecer algumas das plantas e animais mencionados. Mas confesso que recorri ao Google algumas vezes, só por curiosidade.
Todos os 9 contos são muito bons, mas se for pra destacar alguns, eu destacaria “O Burrinho Pedrês” (uma estória com várias miniestórias dentro), “Conversa de Bois” (conto um tanto sombrio) e “A hora e vez de Augusto Matraga” (uma “jornada do herói” que conta até com algumas adaptações para teatro e cinema, entre elas esta que devo assistir logo mais: https://www.youtube.com/watch?v=0h2JAyfBObk )
Apesar do livro se situar em determinado ponto do tempo (primeiras décadas do século passado) e espaço (interior de Minas Gerais), qualquer uma das estórias poderia ser facilmente transportada para outros tempos e outros lugares do Brasil e talvez do mundo. Muitas delas eu conseguiria transportar para Ibaté, no interior de São Paulo, onde passava minhas férias durante a infância e adolescência. E onde também consumia vorazmente os livros pequena (a época) biblioteca local.
Be happy 🙂