As duas novelas constantes de “Duas Narrativas Fantásticas”, denominação dada pelo próprio Dostoiévski, foram publicadas inicialmente pelo autor no Diário de um Escritor, publicação mensal redigida pelo próprio autor entre 1876 e 1879.
Nas duas estórias, os respectivos personagens principais, que não têm nome, é quem são os narradores.
A Dócil
Em A Dócil, um usurário, já na casa dos 40 anos, refaz, ao lado do corpo da jovem mulher que havia acabado de cometer suicídio, todos os passos do relacionamento dos dois. Este homem, que já fora maltratado pela vida e de certa forma se vingava da sociedade através de sua profissão, ao tentar entender as razões que levaram a esposa a cometer o suicídio, percebe que ela também havia sido vítima de sua vingança.
Ao propor o casamento para a moça, ele está apenas pensando na sua “utilidade”, afinal de contas, ele planejava em três anos juntar dinheiro suficiente para comprar uma propriedade, se aposentar e constituir uma família e ela era uma peça neste seu plano. Para isto, ele estabelecer com ela uma relação de dominância e tenta fazer com que ela lhe seja subserviente. Quando esta moça resolve atentar contra este plano, ele começa a se dar conta que sente verdadeiro amor por ela.
Talvez como represália, ela comete o suicídio justamente no momento em que ele começa a tomar consciência deste amor e inclusive começa a abrir mão de suas posses e seus planos.
O Sonho de um Homem Ridículo
Nesta novela, o narrador é um homem melancólico, que se autodenomina “ridículo” e que age com indiferença à ele mesmo e à tudo aquilo que o cerca. Ao tentar cometer suicídio (simplesmente “deixar de ser/existir”), adormece em frente ao revolver e tem um sonho com o planeta terra em uma outra realidade, onde os habitantes ainda não perderam a inocência e vivem usufruindo da vida em comunhão uns com os outros e com todos os seres que os cercam.
É uma ótima reflexão sobre a velha pergunta de “qual é o sentido da vida?” e conta também com algumas críticas à sociedade da época, mas que caberiam muito bem na nossa sociedade atual. Pincei dois trechos que eu achei particularmente interessante:
“Mas a sua sabedoria era mais profunda e mais elevada que a da nossa ciência; uma vez que a nossa ciência busca explicar o que é a vida, ela mesma anseia por tomar consciência da vida para ensinar os outros a viver; ao passo que eles (os habitantes desta outra “terra”), mesmo sem ciência, sabiam como viver, e isso eu entendi, mas não conseguia entender a sua sabedoria.”
“…os ‘sábios’ esforçavam-se o mais depressa possível por exterminar todos os ‘não sábios’ que não entendiam a sua ideia, para que não interferissem no triunfo dela.”
Be happy 🙂